Garimpo ilegal no Brasil: o que é, como acontece e quais conflitos são gerados
Vista aérea de região desmatada da Floresta Amazônica causada por atividades de mineração ilegal no Brasil.

Garimpo ilegal no Brasil: o que é, como acontece e quais conflitos são gerados

Da destruição do meio ambiente a crimes contra comunidades nativas, entenda as consequências do garimpo ilegal no País

Os primeiros registros de garimpo no Brasil datam ainda do século XVI. Logo após a fundação da primeira vila, cartas já eram enviadas à Coroa portuguesa por colonos e jesuítas relatando as “itaberabas” — pedras que brilham, na língua Tupi —, trazidas pelos indígenas.

Cinco séculos depois, o garimpo ilegal ainda é uma atividade muito rentável por aqui, e o Estratégia Vestibulares conversou com a professora Priscila Lima, que dá aulas de Geografia e Atualidades, para entender como a garimpagem e, principalmente, os conflitos causados por ela funcionam no Brasil.

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O que é garimpo?

Garimpo é o nome dado a atividade mineradora feita de forma artesanal. O trabalho dos garimpeiros é extrair minerais valiosos que servirão como matéria prima para produtos finais, como ouro, diamantes e ferro, por exemplo.

Esse trabalho é feito, no geral, com equipamentos e ferramentas mais simples e rústicas. É justamente a forma como a atividade do garimpo é executada que a diferencia da mineração: enquanto o garimpo é mais manual, a mineração trabalha com maquinários e grandes volumes de extração

O que a legislação diz sobre o garimpo?

De acordo com a Agência Nacional de Mineração (ANM), as duas situações em que o garimpo é considerado ilegal é quando feito, basicamente, em áreas maiores que 50 hectares ou em terras indígenas.

Constituição Federal

A Constituição Federal de 1988, que rege o Brasil atualmente, por sua vez, cita a mineração em quatro artigos diferentes. Veja:

Art.20. São bens da União:

 IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo.

Por mais que possa parecer, o artigo 20 não define que apenas o Estado pode explorar a extração mineral, e no artigo seguinte, o 21, a Carta explica melhor como a questão deve ser tratada no parágrafo XXV.

Art.21. Compete à União:

XXV – Estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa.

Art. 174, § 3º e 4º:

§ 3º – O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros.

§ 4º – As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e naquelas fixadas de acordo com o Art. 21, XXV, na forma da lei.

E, por último, há o artigo 176, em seus incisos 1º, 2º e 3º apresenta mais determinações para o exercício do garimpo:

Art. 176, § 1º, 2º e 3º

§ 1º – A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas.

§ 2º – É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na forma e no valor que dispuser a lei.

§ 3º – A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as autorizações e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou transferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente.

Projeto de Lei 191

Em fevereiro de 2020, o presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou junto à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº191/2020, que tem como objetivo legalizar o garimpo em territórios indígenas. O PL ainda não foi pautado pelo Poder Legislativo.

Quais jazidas são exploradas?

As jazidas são os locais em que se encontram os minerais que serão garimpados. A professora Priscila Lima explica que essas jazidas surgem em formações geológicas chamadas “Estruturas Cristalinas”. E o que explica o Brasil ser um País com bastante atividade de garimpo é justamente esse tipo de geologia: “Praticamente 36% do território brasileiro é ocupado por Estruturas Cristalinas”, explica ela. 

Veja na tabela as regiões do Brasil com maior concentração de garimpo e quais minerais são explorados nelas, de acordo com a professora Priscila:

Província mineradora / EstadoEstrutura geológicaMinériosObservações
Xingu – ParáSerra dos Carajás (especialmente)Manganês, cobre, cassiterita, níquel, bauxita e ferroMaiores reservas minerais do Brasil
Mantiqueira – Minas GeraisQuadrilátero FerríferoFerro e manganêsImportante para a industrialização/siderurgia
Tocantins – Mato Grosso do SulMaciço do Urucum ManganêsReservas entre as maiores do mundo 
São Francisco – BahiaCobre e diamante
Guiana MeridionalEstanho, manganês e diamante 

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O que o garimpo causa no meio ambiente?

Quando se trata da degradação causada pela atividade de garimpo no meio ambiente, é importante levar em consideração qual é o tipo de garimpagem empregada naquela região. 

Em explorações em rios, como as feitas ilegalmente nas Terras Indígenas (TI) Yanomami, por exemplo, “o que está acontecendo é que aumenta o assoreamento, porque os garimpeiros invertem o sentido do rio. Se, por exemplo, a extração é para ouro, você tem o uso do mercúrio: joga o mercúrio na água para poder enxergar onde está o ouro”, explica a professora Priscila.

Ainda no emprego do mercúrio no garimpo, a professora explica os riscos às comunidades locais: “Esse caso do mercúrio levou à contaminação da água do rio e muitos indígenas foram contaminados, muitos adoeceram, perderam muito peso, pelo uso do mercúrio”.

Já quando feito no solo, o garimpo causa desmatamento e junto a essa degradação vem os problemas de perda de biodiversidade, erosão e desertificação do solo, além da alteração no clima da região. 

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Sobrevoo em 2020 mostra atividade de garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami – Foto: Chico Batata/ Greenpeace – maio de 2020

O garimpo na economia nacional

A professora Priscila Lima conta que a extração de minérios impacta muito a economia do Brasil. Isso porque, a extração está associada ao abastecimento de matérias primas industriais, com destaque para o ferro.

“A extração de ferro ganha um grande destaque, que está entre os cinco maiores produtos de exportação do Brasil, costuma ficar em terceiro, perdendo só para a soja e os derivados do petróleo”, explica Priscila.

Informações divulgadas em fevereiro pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) apontam que em 2021 o setor mineral brasileiro alcançou 1,150 bilhão de toneladas extraídas, alta de 7% em relação a 2020. Os maiores faturamentos foram observados no Pará, com R$ 146,6 bilhões (+51%); Minas Gerais, R$ 143 bilhões (+87%); e Bahia, R$ 9,5 bilhões (+67%).

Conflitos envolvendo garimpo ilegal no Brasil

Os conflitos que envolvem garimpeiros ilegais no Brasil, são, em sua maioria, contra comunidades quilombolas e indígenas moradoras dos locais em que há extração. Os povos indígenas, em especial, são os mais afetados, já que além da violência direta, acabam tendo suas terras e rios que serviam de abastecimento, contaminados por substâncias tóxicas, e a destruição de seus locais sagrados, de moradia e agricultura.

O relatório Conflitos no Campo Brasil 2021, realizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) este ano, mostra que o garimpo é o principal disseminador de violência no campo. Segundo o documento, a atividade garimpeira foi responsável por 92% das mortes por conflitos registradas pela CPT em 2021.

Além disso, o relatório ainda aponta que, nos últimos dez anos, os conflitos envolvendo garimpeiros aumentaram 80.000%. Enquanto no ano de 2011 foi registrado um conflito violento, em 2021 esse número subiu para 81. Veja os números da década:

AnoNúmero de conflitos violentos
20111
20122
20122
20146
20156
20169
20179
20189
201926
202039
202181
Reprodução/Conflitos no Campo 2021 (CPT)

Povo Yanomami

Os ataques de abril de 2022 a uma aldeia do povo indígena Yanomami, no estado de Roraima, é o episódio de violência envolvendo o garimpo mais falado ultimamente. Isso porque, uma campanha intitulada “Cadê os Yanomami?” ganhou as redes sociais no último mês, após a invasão dos garimpeiros, que acarretou na fuga da comunidade.

Em 25 de abril de 2022, o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Yek’wana (Condisi-YY), Júnior Hekurari Yanomami, divulgou um vídeo em que afirma ter recebido a informação que uma adolescente 12 anos, uma criança e uma mulher foram sequestradas por garimpeiros na comunidade Aracaçá, na Terra Indígena (TI) Yanomami.

No relato, Júnior ainda conta que a adolescente foi estuprada e morta pelos garimpeiros, enquanto a criança havia caído do barco e estava desaparecida no rio.

Povo Kanamari

Quatro dias antes da denúncia de ataques ao povo Yanomami, em 21 de abril de 2022, foi a comunidade indígena Kanamari, da Terra Indígena (TI) Vale do Javari, no Amazonas — local com a maior concentração de populações indígenas isoladas do planeta —, que teve suas terras invadidas por garimpeiros ilegais.

No ataque, denunciado pelo Centro de Trabalho Indigenista (CTI), os garimpeiros não apenas invadiram a comunidade, levando risco à saúde dos moradores isolados, como também organizaram uma festa sem a autorização dos indígenas. Na ocasião, os garimpeiros forçaram a comunidade a consumir gasolina com água e álcool etílico com suco, além de violentarem sexualmente mulheres do povoado.

Garimpeiros ilegais durante invasão à comunidade Kanamari – Fotos: Centro de Trabalho Indigenista (CTI)

Povo Xipaya

A denúncia da invasão de garimpeiros à aldeia Karimaa, no Pará, veio da cacica Juma Xipaya, em 14 de abril de 2022. De acordo com o relato, uma balsa de grande porte, com maquinários para a extração de ouro e garimpeiros armados, desceu o Rio Iriri em direção ao território. 

O pai da cacica, Francisco Kuruaya, que pediu a retirada dos garimpeiros do território em que fazem extração ilegal, foi agredido pelo grupo. “Meu pai tentou filmar a ação dos garimpeiros, que já chegaram lá operando as dragas, mas foi agredido por oito homens armados que tentaram tomar o celular dele. A sorte foi que ele conseguiu sair e voltar para avisar as outras aldeias”, declarou Juma ao portal Amazônia Real.

Balsa apreendida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) – Foto: Print de vídeo veiculado na conta do Instagram de Juma Xipaya

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Como o garimpo pode cair no vestibular?

Depois do panorama sobre o garimpo ilegal no Brasil, é hora de entender como o assunto pode chegar até você nas provas dos vestibulares. Segundo a professora Priscila, o garimpo pode ser abordado em Geografia e Atualidades.

Ela diz que é importante associar a garimpagem à estrutura geológica do Brasil, que favorece a atividade. E, além disso, o ramo possui um importante papel econômico no País, o que incentiva monetariamente a exploração: “Entender o porquê esses minérios são tão importantes, porque querem extrair, a relevância econômica… E aí, pensar a cadeia produtiva, diferenciar os minérios metálicos que nós temos aqui”, explica.

Já em atualidades, a professora chama a atenção para movimentos contra o garimpo, em especial, os que se manifestam contrariamente à exploração do lítio, que não é uma jazida relevante no território brasileiro, mas bastante expressiva em outros países.

Priscila aponta que o lítio é o mineral que serve de matéria prima para baterias de smartphones e computadores portáteis, principalmente, e que é importante diferenciar esse tipo de exploração da garimpagem que ocorre no Brasil.

“No caso do Brasil, a extração está mais articulada a uma cadeia produtiva dentro da indústria geral, não de tecnologia. No lítio precisa extrair bastante, são as chamadas terras raras, que são minérios fundamentais para baterias de celular, de notebook, e a gente não vive sem isso hoje”, conta.

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