Na Antiguidade grega, a loucura tinha um caráter mitológico que se misturava à normalidade. Num tempo em que a noção de passado era vaga, a escrita inexistia e os deuses decidiam tudo, o “louco” era uma espécie de ponte com o oculto. De sua boca, vinham informações quentinhas lá de cima, e não se tinha dúvida: eram eles, os deuses, que decidiam que tipo de loucura a pessoa teria. Isso até Hipócrates, o pai da medicina, estragar a festa do panteão, lá por volta do século 4 a.C.
“Se a voz dele (o doente) ficar mais intensa, comparam-no a um cavalo e então se afirma que Poseidon é o responsável”, ironizava. “Um absurdo”, pensava ele, que finalmente separou doença mental de deuses e mitos. Hipócrates sistematizou então a teoria dos humores. Era a bílis que afetava o comportamento e causava a loucura, fosse melancolia ou mania — ou seja, loucura calma ou agressiva. Confusão ainda maior estava em crer que o pânico era causado pelo deslocamento do cérebro, por sua vez aquecido pela bílis vinda pela corrente sanguínea. Platão também deu seu pitaco no século 5 a.C. — e desde então, até o século 19, a filosofia foi a linha mestra para entender a loucura. Sua teoria das 3 mentes (a racional, a emotiva e a instintiva) pregava: se uma delas se desequilibrasse, surgia a desordem mental. Claro, o que para eles causava o desequilíbrio eram as glândulas, e não o cérebro. A coisa muda pouco com os romanos. Galeno (130 d.C.) incrementou a hipótese da boa e · velha bílis: a amarela causaria a mania (alegre, furiosa ou homicida), e a negra, a melancolia. Assim, com poucas variações, a relação entre corpo e mente virou a base para compreender a loucura, o que seria retomado durante o Renascimento, após um longo intervalo em que — Deus (dessa vez, um só) — voltou com força total: a Idade Média. (VIEIRA, 2011, p. 6).
A forma como a sociedade, na história do homem, se relacionava com a loucura, refletia a organização social dessa própria sociedade e seus sistemas de crenças e valores.
Nesse contexto, pode-se inferir: