BRASI DE CIMA E BRASI DE BAXO (Fragmento)
Meu compadre Zé Fulô,
Meu amigo e companhêro,
Faz quage um ano que eu tou
Neste Rio de Janêro;
Eu saí do Cariri
Maginando que isto aqui
Era uma terra de sorte,
Mas fique sabendo tu
Que a miséra aqui no Su
É esta mesma do Norte.
Tudo o que procuro acho.
Eu pude vê neste crima,
Que tem o Brasi de Baxo
E tem o Brasi de Cima.
Brasi de Baxo, coitado!
É um pobre abandonado;
O de Cima tem cartaz,
Um do ôtro é bem deferente:
Brasi de Cima é pra frente,
Brasi de Baxo é pra trás.
Aqui no Brasil de Cima,
Não há dô nem indigença,
Reina o mais soave crima
De riqueza e de opulença;
Só se fala de progresso,
Riqueza e novo processo
De grandeza e produção.
Porém, no Brasi de Baxo
Sofre a feme e sofre o macho
A mais dura privação.
Brasi de cima festeja
Com orquestra e com banquete,
De uísque dréa e cerveja
Não tem quem conte os rodete.
Brasi de baxo, coitado!
Vê das casa despejado
Home, menino e muié
Sem achá onde morá
Proque não pode pagá
O dinhêro do alugué.
No Brasi de Cima anda
As trombeta em arto som
Ispaiando as propaganda
De tudo aquilo que é bom.
No Brasi de Baxo a fome
Matrata, fere e consome
Sem ninguém lhe defendê;
O desgraçado operaro
Ganha um pequeno salaro
Que não dá pra vivê.
Inquanto o Brasi de cima
Fala de transformação,
Industra, matéra-prima,
Descobertas e invenção,
No Brasi de Baxo isiste
O drama penoso e triste
Da negra necissidade;
É uma coisa sem jeito
E o povo não tem dereito
Nem de dizê a verdade.
No Brasi de Baxo eu vejo
Nas ponta das pobre rua
O descontente cortejo
De criança quage nua.
Vai um grupo de garoto
Faminto, doente e roto
Mode caçá o que comê
Onde os carro põe o lixo,
Como se eles fosse bicho
Sem direito de vivê.
Estas pequenas pessoa,
Estes fio do abandono,
Que veve vagando à toa
Como objeto sem dono,
De manêra que horroriza,
Deitado pela marquiza,
Dromindo aqui e aculá
No mais penoso relaxo,
É deste Brasi de Baxo
A crasse dos Marginá.
Meu Brasi de Baxo, amigo,
Pra onde é que você vai?
Nesta vida do mendigo
Que não tem mãe nem tem pai?
Não se afrija, nem se afobe,
O que com o tempo sobe,
O tempo mesmo derruba;
Tarvez ainda aconteça
Que o Brasi de Cima desça
E o Brasi de Baxo suba.
[...]
(ASSARÉ, Patativa do. Melhores poemas. Seleção de Cláudio Portella. São Paulo: Global, 2006. p.329-332)~
O poema de Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré, reflete sobre a existência de dois Brasis. É correto afirmar que a principal crítica que se dá a ver através da leitura do poema diz respeito