Chorou muito tempo na mesma posição, chorou por muitas razões, às vezes todas juntas, às vezes cada uma por seu turno, teve raiva de sentir pena de si mesma, principalmente teve raiva por sentir vergonha, por que haveria de sentir vergonha, quando não tinha feito nada? Mas tinha cada vez mais vergonha e ódio por essa vergonha que sabia que não podia ser dela, mas era, mas era, era, era, era! Pois ele também lhe passara a vergonha que devia ser dele mas nele era triunfo, saíra do quarto pavoneado e de cabeça erguida, haveria até entre os negros quem risse ou debochasse quando soubesse de tudo, e lhe vinha tanta mais vergonha que quase não podia suportar pensar. Suja, muito suja, suja de todas as maneiras, doída, tão doída, ela abraçou a si mesma, sozinha, tão sozinha, sozinha tão sem remédio, e ficou dormente.
João Ubaldo Ribeiro – Viva o povo brasileiro. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.
Nesse romance, a personagem Naê é uma escrava que teve contato com o senhor Perilo Ambrósio. A partir da passagem acima, pode-se inferir que ela