Coloquei-me acima da minha classe, creio que me elevei bastante. Como lhes disse, fui guia de cego, vendedor de doces e trabalhador alugado. Estou convencido de que nenhum desses ofícios me daria os recursos intelectuais necessários para engendrar esta narrativa. Magra, de acordo, mas em momentos de otimismo suponho que há nela pedaços melhores que a literatura do Gondim. [...] devo confessar que a superioridade que me envaidece é bem mesquinha.
Além disso, estou certo de que a escrituração mercantil, os manuais de agricultura e pecuária, que forneceram a essência da minha instrução, não me tornaram melhor que o que eu era quando arrastava a peroba. Pelo menos naquele tempo não sonhava ser o explorador feroz em que me transformei.
Quanto às vantagens restantes, casas, terras, móveis, semoventes, consideração de políticos, etc. – é preciso convir em que tudo está fora de mim. Julgo que me desnorteei numa errada.
RAMOS, Graciliano. São Bernardo. 46 ed. Rio de Janeiro: Record, 1986, p. 182-183.
Essa última parte do romance, inserida no contexto da sua história de vida, revela que Paulo Honório