Com base nos poemas abaixo, de Carlos Drummond de Andrade, assinale a alternativa INCORRETA.
Mãos dadas
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história, não direi
os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela, não
distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida, não fugirei para
as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a
vida presente.
Fraga e sombra
A sombra azul da tarde nos confrange.
Baixa, severa, a luz crepuscular. Um
sino toca, e não saber quem tange é
como se este som nascesse do ar.
Música breve, noite longa. O alfanje
que sono e sonho ceifa devagar mal
se desenha, fino, ante a falange das
nuvens esquecidas de passar.
Os dois apenas, entre céu e terra,
sentimos o espetáculo do mundo, feito
de mar ausente e abstrata serra.
E calcamos em nós, sob o profundo
instinto de existir, outra mais pura vontade
de anular a criatura.
Os mortos de sobrecasaca
Havia a um canto da sala um álbum de fotografias intoleráveis,
alto de muitos metros e velho de infinitos minutos, em que todos
se debruçavam na alegria de zombar dos mortos de sobrecasaca.
Um verme principiou a roer as sobrecasacas indiferentes e roeu as
páginas, as dedicatórias e mesmo a poeira dos retratos. Só não
roeu o imortal soluço de vida que rebentava que rebentava
daquelas páginas.