Compare os poemas Com licença poética e Enredo para um tema, de Adélia Prado.
Com licença poética
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta,
vai carregar bandeira..
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
– dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
Enredo para um tema
Ele me amava, mas não tinha dote,
anunciou: só os cabelos pretíssimos e uma beleza
de príncipe de estórias encantadas
Não tem importância, falou a meu pai,
se é só por isto, espere.
Foi-se com uma bandeira
e ajuntou ouro pra me comprar três vezes.
Na volta me achou casada com D. Cristóvão.
Estimo que sejam felizes, disse.
O melhor do amor é sua memória, disse meu pai.
Demoraste tanto, que... disse D. Cristóvão.
Só eu não disse nada,
nem antes, nem depois.
a) Discorra sobre a constituição da imagem feminina em cada um dos poemas. Exemplifique sua argumentação com trechos dos poemas.
b) Que sentidos são criados pela utilização das reticências no verso “Demoraste tanto, que... disse D. Cristóvão”?
Explique a função desempenhada pelas reticências para criar essas significações, nesse poema.