Questão
Universidade Federal de Tocantins - UFT
2011
Fase Única
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Dias de chuva

Cai a chuva lá fora. Plac! plac! ouço-a cantando em goteiras e cornijas, no cimento molhado da rua e nas vidraças embaçadas do meu quarto. Não sei por que, vendo o borraceiro descer, o espírito embebe-se-me em doce e longínqua rêverie.

Vejo, através duma tela úmida as paisagens distantes do meu torrão natal, e afaz-se-me a que ando viajando, como antigamente, por esses sertões, sentindo sob o pala de viagem a água cirandar forte, cabriolando e verdascando sobre os serros longes, as saraivadas, ou peneirando grosso, em meio o rendilhado sombrio da floresta por onde vou.

Assim, anos lá vão, cavalgava eu por essas estradas ermas da minha terra remota, um macho perrengue de aluguer, ou o lépido alazão Dourado, em férias, rumo do Sítio. Dia em meio, casais de araras e bandos de papagaios despregavam dum jenipapeiro qualquer de tapera o seu voo balofo, e passavam alto, em gritaria álacre de contentados; cracarás corriam escrutadores e solertes pelos campos, em surtos rasteiros de carnívoros. O verde das campinas, das orlas de mato longe, quando ganhava a chapada, tinha deslumbramentos intensos de seiva robusta e viva.

E –plac! plac! –arremedando como agora a chuva das goteiras, segue o alazão caminho afora, pelo alagado trilho de argila vermelha, deixando atrás, vincado, o molde de seus cascos ferrados, chapinhando pelo rego das enxurradas, crinas pendidas, cabeça baixa, a resfolegar...

Hugo Carvalho Ramos. Tropas e boiadas.

Sobre o conto Dias de Chuva, de Hugo Carvalho Ramos, é INCORRETO afirmar que:
A
Do ponto de vista estilístico, a linguagem apresenta traços de regionalismo, como se observa no fragmento "...casais de araras e bandos de papagaios despregavam dum jenipapeiro qualquer de tapera o seu voo balofo, e passavam alto, em gritaria álacre de contentados; cracarás corriam escrutadores e solertes..."
B
Quanto ao estilo, observa-se a busca pela originalidade, através da criação e valorização da paródia e do tom humorístico na narrativa, como no seguinte fragmento "Cai a chuva lá fora. Plac! plac! ouço-a cantando em goteiras e cornijas..."
C
Pela leitura do fragmento "Cai a chuva lá fora. Plac! plac! ouço-a cantando em goteiras e cornijas, no cimento molhado da rua e nas vidraças embaçadas do meu quarto", percebe-se que o conto é narrado em primeira pessoa e que o foco narrativo é do narrador personagem.
D
Neste conto, a onomatopéia "plac! plac!" é utilizada, num primeiro momento, para representar o barulho da chuva e, posteriormente, para representar os passos do alazão.
E
No fragmento "Vejo, através duma tela úmida as paisagens distantes do meu torrão natal, e a faz-se-me a que ando viajando, como antigamente, por esses sertões", o narrador personagem rememora com nostalgia o passado.