EROS E PSIQUE
Conta a lenda que dormia
Uma princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentando,
Vencer o mal e o bem
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A princesa adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o destino –
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro
Chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A princesa que dormia.
Fernando Pessoa. Obra Poética. Rio de Janeiro. Nova Aguilar, 1986. pag.181
Sobre as características linguísticas do texto, considere as afirmativas a seguir.
I. O pronome relativo que em “... que viria de além do mundo da estrada” retoma o termo Infante e torna-se o sujeito da oração que introduz.
II. No verso “Sonha em morte a sua vida” há uma figura de oposição chamada antífrase.
III. O verbo dormir do verso “A princesa que dormia” apresenta um aspecto inconcluso e encontra-se no tempo verbal do pretérito imperfeito do indicativo.
IV. “Rompe o caminho fadado”, a palavra fadado pode ser substituída por impedido sem que isso cause alteração semântica no enunciado.
Estão corretas apenas as afirmativas: