Essa carta tornar-se-ia, como lapidarmente a caracterizou Jaime Cortesão, o «auto oficial do nascimento do Brasil e do Novo Mundo». Mas esse seu significado emblemático ela deve-o não apenas ao relato factual – outros da descoberta nos ficaram, como uma carta de Mestre João médico de bordo, e a «relação» de um piloto anónimo –, mas à linguagem em que está escrita e que configura um texto de grande qualidade literária, para além do seu estatuto histórico, que decorre das funções próprias de Pêro Vaz de caminha: «... O escritor, que ele é, alvorece na pelo do escrivão», como Cortesão assinalou. Estamos perante um discurso que releva arqui-textualmente de vários registros, desde o do género epistolar, de que se reclama, ao narrativo ou mesmo poético, passando pelo que hoje designaríamos como etnológico ou antropológico. É esse hibridismo discursivo, para que chamou a atenção Maria Alzira Seixo, abonando-se na acepção dialógica bakhtiniana do termo, que dá à literariedade da Carta todo o seu efeito aliciante, como testemunho do comportamento dos ameríndios no contacto com os Portugueses, nesse instante privilegiado de uma descoberta mútua.
SEABRA, José Augusto. A descoberta do Outro na Carta de Pêro Vaz de Caminha (p. 65-66).
Disponível em: https://tinyurl.com/yfv7s56s. Acesso em: 1o dez. 2023.
A partir da leitura do texto, dê exemplos, dentro da Carta de Achamento:
a) do que Jaime Cortesão chamou de “auto oficial do nascimento do Brasil e do Novo Mundo”;
b) do que Maria Alzira Seixo chamou de “hibridismo discursivo”.