Questão
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
2002
Fase Única
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O FRADE E A FREIRA

Quando a região se povoava no trabalho da terra, vieram também os semeadores da Fé, pregando e sofrendo ao lado dos homens pecadores.

Um frade ali missionou, ensinando orações e espalhando exemplos de esperança.

Era moço, forte, soldado da milícia que vencia o mundo, batalhando por Jesus Cristo.

Na aldeia, não mais acampamento indígena e ainda não Vila-del-Rei, freiras divulgavam a ciência do esforço e do sacrifício, silenciosa e contínua como o correr de um rio na solidão.

Aqueles que se deram a Deus, só a Ele pertencerão eternamente. O amor divino é absoluto e completo. Nada restará para a esmola a outros amores.

Frade e freira, servo e esposa de Cristo, amaram-se, tendo os sinais visíveis do juramento a um outro amor, inviolável e severo.

Foram amando e padecendo, abafando no coração a chama alta do desejo fremente, invasora, sonora de paixão.

As razões iam desaparecendo na marcha alucinante de um amor tão vivo e maravilhoso como a terra virgem que o acolhia.

De furto, orando, chorando, penando, encontravam-se para um olhar mais demorado e uma recordação mais cruel e deliciosa.

Nas margens do Itapemirim andavam as duas sombras negras, lentas, numa procissão de martírio, resistindo às tentações da floresta, do silêncio e da vontade envolvedora.

Se foram ou não um do outro, num milagre humano de esquecimento, não recorda a memória popular.

Apenas, uma vez, não voltaram às suas casas. Faltou um frade nas “matinas” e houve um lugar vago entre as freiras.

Às margens do Itapemirim, claro e rápido, sobre fundamentos de granito, ergueu-se o casal, num diálogo que atravessa os séculos, ouvido pelas tempestades e compreendido pelos passarinhos.

É o grupo do FRADE E A FREIRA...

Transformou-os Deus em duas estátuas de pedra, reconhecíveis, identificáveis, perfeitas.

Não os separou nem os uniu num abraço perpétuo à face dos homens.

Deixou-os próximos e distanciados, nas atitudes de meditação e de reza, de sonho e de resignação, frente a frente, imagem da imóvel fidelidade, da obstinação amorosa, esperando o infinito.

E assim, eternamente, ficarão..

CASCUDO, L. C. Lendas brasileiras.4.ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2000, p. 79-81.

O relacionamento amoroso entre os protagonistas está expresso também por meio de elementos paradoxais. Esse procedimento de construção encontra-se em:
A
“Transformou-os Deus em duas estátuas de pedra, reconhecíveis, identificáveis, perfeitas”.
B
“De furto, orando, chorando, penando encontravam-se para um olhar mais demorado e uma recordação cruel e deliciosa”.
C
“Se foram ou não um do outro, num milagre humano de esquecimento, não recorda a memória popular”.
D
“Nas margens do Itapemirim andavam as duas sombras negras, lentas numa procissão de martírio...”.