Leia os fragmentos de textos I e II para responder a QUESTÃO.
Texto I
Metamorfose
Quando Gregório Souza acordou certa manhã de uma noite mal dormida cheia de sonhos perturbadores, olhou seus pés que emergiam da outra extremidade da coberta curta e viu que tinha se transformado em Franz Kafka. Na verdade, levou algum tempo para descobrir quem era. Começou certificando-se que aqueles pés, decididamente, não eram os dele.
Examinou-os com interesse e deduziu que eram pés da Europa Central, possivelmente checos. Mas só quando sua mãe entrou no quarto e ele respondeu ao seu “bom-dia!” em checo, espantando-se tanto quanto a ela, deu-se conta de quem era.
Não sabia explicar como acontecera aquilo. Não só ele era Kafka como toda a situação era puro Kafka. Sua mãe gritando, perguntando quem ele era e o que estava fazendo na cama do seu filho – pelo menos ele imaginava que era isto que ela dizia, pois não conseguia entendê-la – e ele, apalpando-se, ao mesmo tempo assustado e maravilhado, eu Franz Kafka!
Fonte: VERÍSSIMO. Luís Fernando. “Metamorfose”. In: COSTA, Flávio Moreira da (org.). Os 100 melhores contos de humor da literatura universal. In: Rio de Janeiro: Ediouro, 2001, p. 527. (fragmento).
Texto II
A metamorfose
Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso. Estava deitado sobre suas costas duras como couraça e, ao levantar um pouco a cabeça, viu seu ventre abaulado, marrom, dividido por nervuras arqueadas, no topo de qual a coberta, prestes a deslizar de vez, ainda mal se sustinha. Suas numerosas pernas, lastimavelmente finas em comparação com o volume do resto do corpo, tremulavam desamparadas diante dos seus olhos.
— O que aconteceu comigo? — pensou.
Não era um sonho. Seu quarto, um autêntico quarto humano, só que um pouco pequeno demais, permanecia calmo entre as quatro paredes bem conhecidas. Sobre a mesa, na qual se espalhava, desempacotado, um mostruário de tecidos — Samsa era caixeiro viajante, — pendia a imagem que ele havia recortado fazia pouco tempo de uma revista ilustrada e colocado numa bela moldura dourada. Representava uma dama de chapéu de pele e boa pele que, sentada em posição ereta, erguia ao encontro do espectador um pesado regalo também de pele, no qual desaparecia todo o seu antebraço.
O olhar de Gregor dirigiu-se então para a janela e o tempo turvo — ouviam-se gotas de chuva batendo no zinco do parapeito — deixou-o inteiramente melancólico. — Que tal se eu continuasse dormindo mais um pouco e esquecesse todas essas tolices? — pensou, mas isso era completamente irrealizável, pois estava habituado a dormir do lado direito e no seu estado atual não conseguia se colocar nessa posição.
Qualquer que fosse a força com que se jogava para o lado direito balançava sempre de volta à postura de costas. Tentou isso umas cem vezes, fechando os olhos para não ter de enxergar as pernas desordenadamente agitadas, e só desistiu quando começou a sentir do lado uma dor ainda nunca experimentada, leve e surda.
KAFKA, Franz. A metamorfose. Tradução de Modesto Carone. Companhia das Letras: São Paulo, 1997, p. 06. (fragmento)
I. O texto Metamorfose, de Luís Fernando Veríssimo, cria um diálogo intertextual com outro clássico da literatura, A metamorfose, de Franz Kafka.
II. Ambos os textos literários contam a história de um homem que um dia acordou metamorfoseado.
III. Os textos abordam uma experiência individual, em que no texto I, Gregório Souza se metamorfoseia em Kafka, e no texto II, Gregor Samsa se metamorfoseia em um inseto.
IV. Os fragmentos “Não só ele era Kafka como toda a situação era puro Kafka” e “Que tal se eu continuasse dormindo mais um pouco e esquecesse todas essas tolices?” demonstram a inquietude dos personagens frente às novas condições.
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