Questão
Simulado UNESP
2021
Fase Única
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Leia a crônica “Esta é uma declaração de amor”, de Clarice Lispector (1920-1977).

Esta é uma declaração de amor: amo a língua portuguesa. Ela não é fácil. Não é maleável. E, como não foi profundamente trabalhada pelo pensamento, a sua tendência é a de não ter sutilezas e de reagir às vezes com um verdadeiro pontapé contra os que temerariamente ousam transformá-la numa linguagem de sentimento e de “alerteza”. E de amor. A língua portuguesa é um verdadeiro desafio para quem escreve. Sobretudo para quem escreve tirando das coisas e das pessoas a primeira capa de superficialismo.

Às vezes ela reage diante de um pensamento mais complicado. Às vezes se assusta com o imprevisível de uma frase. Eu gosto de manejá-la —como gostava de estar montada num cavalo e guiá-lo pelas rédeas, às vezes lentamente, às vezes a galope.

Eu queria que a língua portuguesa chegasse ao máximo nas minhas mãos. E esse desejo todos os que escrevem têm. Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar para sempre uma herança de língua já feita. Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida.

Essas dificuldades nós as temos. Mas não falei do encantamento de lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me chega.

Clarice Lispector. Declaração de amor. In: Crônicas para jovens: de escrita e vida. Rio de Janeiro: Rocco Digital, p. 11 (com adaptações).

Depreende-se do texto que, para a autora, o exercício da escrita lhe imprime responsabilidade porque a língua portuguesa é:
A
um produto já acabado, de tal forma que o escritor precisa ser um artesão para esculpir a língua, um resultado já pronto, até a perfeição.
B
como se fosse uma criança com temperamento difícil, que exige cuidado e atenção para não se tornar irrepreensível.
C
um processo de acumulação cultural que não se esgota quando surge certa genialidade, pois, como se fosse viva, demanda processo.
D
uma bandeira nacionalista, símbolo através do qual deve ser exaltado o cânone humanista, como é o caso de Camões.
E
um mecanismo que retroalimenta ideias antigas e ultrapassadas e que precisam ser constantemente renovadas.