Leia a crônica “O rei dos animais”, de Luís Martins, para responder à questão.
O homem, com louvável modéstia, julga-se o rei dos animais. Resta saber se essa opinião é partilhada pelos outros animais. Tenho um amigo que levou parte da vida estudando a linguagem dos bichos e, ao cabo de pacientes observações, conseguiu colher entre eles algumas definições valiosas, que talvez sirvam para modificar (ou confirmar) aquele conceito.
O cão, por exemplo, que de todos os bichos é o que mais intimamente conhece o homem, definiu-o numa única frase, evidentemente plagiada do próprio homem:
— É o mais fiel inimigo do cão.
Já o caranguejo expôs com certa rabugice sua opinião, que vem demonstrar como tudo neste mundo depende do ponto de vista:
— O homem anda às avessas, exceto quando está de automóvel e dá marcha à ré.
Interpelado pela nossa reportagem, o siri recusou-se a fazer longas declarações, limitando-se a dizer, com certa ironia:
— Para falar, o homem é um verdadeiro papagaio.
Esta não é, entretanto, a opinião do papagaio, que declarou, com surpreendente concisão:
— É um boca de siri.
Já o mosquito foi mais loquaz e zumbiu:
— O homem é um animal daninho, cruel e venenoso, que expele o veneno por meio de jatos mortíferos. Quando desprovido de sua arma, que se chama bomba de flit, é inofensivo. Sua carne é saborosa.
O sapo preferiu estudá-lo pelo lado estético:
— O belo, para o homem, é a mulher.
E a onça, pelo lado moral:
— É meu amigo.
A mosca encarou-o sob o ângulo da higiene:
— O homem é um porco; vivo limpando todas as suas sujeiras.
O porco limitou-se a protestar, mas a galinha foi impertinente:
— É um bípede implume; e ainda tem o cinismo de confessá-lo!
O caramujo, abalizado sociólogo, estudou o homem sob o ponto de vista da ecologia:
— As fêmeas vivem dentro das casas; os machos sustentam as casas às costas.
A preguiça disse:
— Como é ágil!
A lebre:
— É um moleirão!
A formiga:
— Um gigante. Que medo, ô!
E o elefante:
— Qual nada! Não passa de um pobre pigmeu.
Já a girafa assim se exprimiu:
— Pequeno animal muito desgracioso e desproporcionado, inteiramente desprovido da parte mais bela do corpo, que é o pescoço, como se sabe.
O touro declarou, numa doce reprovação:
— O homem é a negação de Deus: Deus fez o touro, o homem fez o toureiro.
Mas o micróbio, que é pessimista por natureza, foi desdenhoso e arrasador:
— Não tomo conhecimento do homem. Por aí se vê que talvez o homem não seja tão rei dos animais quanto se imagina.
(Humberto Werneck (org.). Boa companhia, 2005.)
O cronista recorre a um enunciado paradoxal em: