Questão
Universidade Federal de Roraima - UFRR
2015
Fase Única
Leia-fragmento-livro31582e8fccb
Leia o fragmento do livro de A hora da estrela de Clarice Lispector para responder à questão.

TEXTO I

Escrevo neste instante com algum prévio pudor por vos estar invadindo com tal narrativa tão exterior e explícita. [...]

Como é que sei tudo o que vai seguir e que ainda o desconheço, já que nunca o vivi? É que numa rua do Rio de Janeiro peguei no ar de relance o sentimento de perdição no rosto de uma moça nordestina. Sem falar que eu em menino me criei no Nordeste. Também sei das coisas por estar vivendo. Quem vive sabe, mesmo sem saber que sabe. Assim é que os senhores sabem mais do que imaginam e estão fingindo de sonsos. [...] A história – determino com falso livre-arbítrio – vai ter uns
sete personagens e eu sou um dos mais importantes deles, é claro. Eu, Rodrigo S. M. Relato antigo, este, pois não quero ser modernoso e inventar modismos à guisa da originalidade. Assim é que experimentarei contra meus hábitos uma história com começo, meio e “gran finale”, seguido de silêncio e chuva caindo.[...] O que escrevo é mais do que invenção, é minha obrigação contar sobre essa moça entre milhares delas. E dever meu, nem que seja de pouca arte, o de revelar-lhe a vida.
Porque há o direito ao grito.
 
Então eu grito.

Grito puro e sem pedir esmola. Sei que há moças que vendem o corpo, única posse real, em troca de um bom jantar em vez de um sanduíche de mortadela. Mas a pessoa de quem falarei mal tem corpo para vender, ninguém a quer, ela é virgem e inócua, não faz falta a ninguém. Aliás – descubro eu agora – também eu não faço a menor falta, e até o que eu escrevo, um outro escreveria. Um outro escritor, sim, mas teria que ser homem porque escritora mulher pode lacrimejar piegas.

Sobre o texto é incorreto afirmar que:
A
A hora da estrela é uma narrativa que foge ao estilo intimista da autora, como pode ser comprovado na seguinte passagem: “Assim é que experimentarei contra meus hábitos uma história com começo, meio e “gran finale”, seguido de silêncio e chuva caindo”. 
  
B
Rodrigo S.M é o narrador-observador e apresenta-se ao leitor sem definir seu objetivo literário, apenas questiona a própria maneira de narrar os fatos, os motivos que o levam a contar a história de uma jovem que pela condição social e econômica também não consegue estabelecer relações amorosas. 
C
A autora vestida na pessoa de Rodrigo S.M., um narrador-personagem, não permite qualquer sentimentalismo ou apelos ao sublime. Isso se verifica na passagem: “Aliás – descubro eu agora – também eu não faço a menor falta, e até o que eu escrevo, um outro escreveria. Um outro escritor, sim, mas teria que ser homem porque escritora mulher pode lacrimejar piegas.”
D
A personagem – a moça – pertence a uma camada social muito diferente da do narrador; 
 
E
A autora denuncia a existência de uma vida anônima e massacrada e, por meio dela, a desigualdade social e as condições sub-humanas de sobrevivência.