Leia as passagens a seguir, retiradas do início da obra O Ateneu, de Raul Pompeia, e do final de Menino de Engenho, de José Lins do Rego, e analise as afirmativas.
“Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta.” Bastante experimentei depois a verdade deste aviso, que me despia, num gesto, das ilusões de criança educada exoticamente na estufa de carinho que é o regime do amor doméstico, diferente do que se encontra fora, tão diferente, que parece o poema dos cuidados maternos um artifício sentimental, com a vantagem única de fazer mais sensível a criatura à impressão rude do primeiro ensinamento, têmpera brusca da vitalidade na influência de um novo clima rigoroso. Lembramo-nos, entretanto, com saudade hipócrita, dos felizes tempos; como se a mesma incerteza de hoje, sob outro aspecto, não nos houvesse perseguido outrora e não viesse de longe a enfiada das decepções que nos ultrajam.
Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam, a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam, das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperanças, a atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo – a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da vida.
Eu tinha onze anos.”
POMPEIA, R. O Ateneu. 1888.
“Todo esse movimento me vencia a saudade dos meus campos, dos meus pastos. Queriam me endireitar, fazer de mim um homem instruído. Quando saí de casa, o velho José Paulino me disse:
– Não vá perder seu tempo. Estude, que não se arrepende.
Eu não sabia nada. Levava para o colégio um corpo sacudido pelas paixões de homem feito e uma alma mais velha do que o meu corpo. Aquele Sérgio, de Raul Pompeia, entrava no internato de cabelos grandes e com uma alma de anjo cheirando a virgindade. Eu não: era sabendo de tudo, era adiantado nos anos, que ia atravessar as portas do meu colégio.
Menino perdido, menino de Engenho.”
Com base nos textos, afirma-se:
I. No texto de Raul Pompeia, é possível perceber o entrelaçamento de diferentes tempos dentro da narrativa, como o tempo de entrada no Ateneu, em que o personagem-narrador tinha onze anos, e o tempo da escrita do texto, em que o narrador faz uma revisão dessa época à luz do presente.
II. O texto de José Lins do Rego utiliza a referência a O Ateneu tanto para retratar a mesma situação, o abandono do lar para seguir os estudos em um colégio interno, quanto para contrastar o estado como os dois meninos entraram na escola. Se o personagem de Raul Pompeia era inocente e angelical, o de Menino no Engenho já estava perdido para a inocência, conhecia as paixões adultas e sabia tudo sobre a vida.
III. Entre as frases “Vais encontrar o mundo. Cora gem para a luta.” e “Não vá perder seu tempo. Estude, que não se arrepende.” subjaz a mesma ideia de que o colégio interno representa um microcosmo da sociedade no qual atuam dife rentes forças de corrupção, de acordo com o determinismo do meio.
A(s) afirmativa(s) correta(s) é/são