Leia o texto de Frans de Waal para responder à questão.
O modo como as pessoas organizam a sociedade talvez não pareça o tipo de assunto com que um biólogo deva se preocupar. O certo seria eu me interessar pelo pica-pau-bico -de-marfim, pelo papel dos primatas na disseminação da aids ou do Ébola, pelo desaparecimento das florestas tropicais, ou se evoluímos ou não dos grandes primatas. Embora esta última questão continue a ser objeto de discussão para algumas pessoas, os paralelos com os animais são mais aceitos hoje em dia, o que facilita a vida dos biólogos. Daí minha decisão de avançar um passo a mais e ver se a biologia pode lançar alguma luz sobre a sociedade humana. Se isso significa entrar em controvérsias políticas, então, que seja. A verdade é que a biologia já faz parte delas. Todo debate sobre a sociedade e o governo parte de enormes pressuposições sobre a natureza humana, apresentadas como se elas derivassem diretamente da biologia. Mas isso quase nunca é verdade.
Nas ciências sociais, por exemplo, a natureza humana é representada pelo velho provérbio hobbesiano ¹Homo homini lupus (“O homem é o lobo do homem”), uma afirmação questionável sobre a nossa espécie baseada em premissas falsas sobre uma espécie diferente. Por essa razão, um biólogo que se interesse em explorar a relação entre a sociedade e a natureza humana não estará realmente fazendo nada de novo. A diferença é que em vez de tentar justificar um modelo ideológico em particular, o biólogo tem um interesse genuíno em compreender o que é a natureza humana e qual a sua origem.
Os estudantes de direito, economia e política carecem dos instrumentos para examinar a sociedade humana com alguma objetividade. Com o que poderão compará-la? Raramente (ou talvez nunca) eles consultam o vasto conhecimento sobre o comportamento humano acumulado pela psicologia, pela biologia ou pela neurociência. Em poucas palavras, a resposta encontrada por essas disciplinas é de que os homens são animais gregários, altamente cooperativos e sensíveis à injustiça, belicosos às vezes, mas na maior parte do tempo amantes da paz. Uma sociedade que ignore essas tendências não poderá funcionar bem. É verdade que somos também animais movidos a incentivos, preocupados com o prestígio social, com o território e com a segurança alimentar, de modo que toda sociedade que desconsidere essas tendências tampouco poderá funcionar adequadamente. A nossa espécie tem um lado social e um lado egoísta.
(A era da empatia, 2009. Adaptado.)
¹hobbesiano: relativo ao filósofo inglês Thomas Hobbes.
A opinião do autor sobre “O homem é o lobo do homem” é: