Leia o trecho do “Sermão da Sexagésima”, de Antonio Vieira (1608-1697)
O mais antigo pregador que houve no mundo foi o Céu. Suposto que o Céu é pregador, deve de ter sermões e deve de ter palavras. E quais são estes sermões e estas palavras do Céu? As palavras são as estrelas, os sermões são a composição, a ordem, a harmonia e o curso delas. Vede como diz o estilo de pregar do Céu, com o estilo que Cristo ensinou na terra? Um e outro é semear; a terra semeada de trigo, o céu semeado de estrelas. O pregar há de ser como quem semeia, e não como quem ladrilha, ou azuleja. Ordenado, mas como as estrelas. Todas as estrelas estão por sua ordem; mas é ordem que faz influ-ência, não é ordem que faça lavor. Não fez Deus o céu em xadrez de estrelas, como os pregadores fazem o sermão em xadrez de palavras. Se de uma parte está branco, da outra há de estar negro; se de uma parte está dia, da outra há de estar noite; se de uma parte dizem luz, da outra hão de dizer sombra; se de uma parte dizem desceu, da outra hão de dizer subiu. Basta que não havemos de ver num sermão duas palavras em paz? Todas hão de estar sempre em fronteira com o seu contrário? Aprendamos do Céu o estilo da disposição, e também o das palavras.
(Antonio Vieira. Essencial, 2011. Adaptado.)
No sermão, Antonio Vieira