Mãitina não se importava, com nenhuns, vinha, ajoelhava igual aos outros, rezava. Não se entendia bem a reza que ela produzia, tudo resmungo; mesmo para falar, direito, direito não se compreendia. A Rosa dizendo que Mãitina rezava porqueado: "Véva Maria zela de graça, pega ne Zesu põe no saco de mombassa..." Mãitina era preta de um preto estúrdio, encalcado, trasmanchada de mais grosso preto, um preto de boi. Quando estava pinguda de muita cachaça, soflagrava umas palavras que a gente não tinha licença de ouvir, a Rosa dizia que eram nomes de menino não saber, coisas pra mais tarde. E daí Mãitina caía no chão, deixava a saia descomposta de qualquer jeito, as pernas pretas aparecendo. Ou à vez gritava: ― "Cena, Corinta!..." ― batendo palmas-de-mão. Isso a mãe explicava: uma vez, fazia muitos, muitos anos, noutro lugar onde moraram, ela tinha ido ao teatro, no teatro tinha uma moça que aparecia por dançar, Mãitina na vida dela toda nunca tinha visto nada tão reluzente de bonito, como aquela moça dançando, que se chamava Corina, por isso aprovava como o povo no teatro, quando estava chumbada. ― "Que é que é teatro, Mãe?" ― Miguilim perguntara. ― "Teatro é assim como no circo-de-cavalinhos, quase..." Mas Miguilim não sabia o que o circo era.
― Dito, você vai imaginar como é que é o circo?
ROSA, Guimarães. Campo geral. In: Manuelzão e Miguilim. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
A mistura entre os discursos contribui para que o texto se torne mais afetivo. Nesse sentido, predominam: