Maraí aproximou-se novamente do moço e abraçou-o por trás, permanecendo assim por alguns instantes. Depois confidenciou seu apreço por ele.
- Você não tem que se preocupar tanto, meu bem. As respostas não cabem a você. O que tiver de acontecer acontecerá, com ou sem a nossa aprovação. Já está tudo escrito nas rochas e nas folhas secas.
- Não consigo pensar assim, Maraí. Certamente vai acontecer independente de nossa vontade, mas tenho a impressão que cabe sim, a nós, interferir no rumo dos acontecimentos. Venho ouvindo isso desde menino. Meus avós sempre me disseram que somos a memória da tradição. O que não está claro é preciso aclarar. O que não é caminho é preciso ser iniciado. Minha cabeça está confusa como os cipós que costuram os galhos das árvores. É preciso cortar esses galhos para que eu possa ver com mais clareza.
MUNDURUKU, Daniel. O Karaíba: uma história do pré-Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 2018. p. 8.
Apesar de os tamoios liderados por Cunhambebe terem sido derrotados historicamente, entre o personagem do romance e o presente do autor a profecia de aliança dos povos indígenas parece ter se efetivado. Se considerarmos que a narrativa é contada por um descendente desses povos — como alerta o texto de orelha do livro —, podemos dizer que há um salto simbólico entre dois momentos históricos, significativo para o sentido que a forma de narrar assume em contraponto à literatura não indígena. Ao invés de optar pela verdade histórica, recusa a perspectiva genocida e afirma a continuidade da luta indígena através dos tempos.
HONORATO, Suene. Estratégias narrativas em O Karaíba, de Daniel Munduruku: recusa da perspectiva histórica genocida. Contexto-Revista do Programa de Pós-Graduação em Letras da UFES, v. 37, p. 241-262, 2020.
Com base na obra O Karaíba: uma história do pré-Brasil de Daniel Munduruku, bem como no fragmento supracitado de Suene Honorato, explique
A) o sentido do título (O Karaíba) e do subtítulo (Uma História do pré-Brasil) da obra e a relação entre ambos, utilizando elementos do enredo para explicá-los.
B) como a narrativa de Daniel Munduruku recusa uma “perspectiva genocida”. Evidencie em sua resposta três aspectos da narrativa como, por exemplo, personagens e elementos do enredo.