Origens do mal
A mente é um livro-caixa, com entradas e saídas: atrás de cada sofrimento, estranheza ou malvadez, deve haver alguma ofensa passada. Nossos sintomas e nossas aberrações seriam compensações ou retribuições: os que foram ofendidos sofrem da reminiscência da injúria passada, e os que passaram por abusos violentos atuam com a crueldade da qual já foram vítimas.
Ora, de tudo o que aprendi na minha formação clínica de psicanalista, há uma regra que se verifica sempre: nossos males são efeitos de nossas interpretações (mais ou menos capengas) do que os outros fizeram conosco. Não são consequências diretas das ações dos outros.
Por isso é possível mudar. Por isso o passado não constitui propriamente um destino – porque nunca somos apenas o efeito dos abusos sofridos. Em alguma medida, sempre decidimos o sentido e o alcance que atribuímos à violência da qual fomos vítimas. Somos, portanto, os artesãos de nossas reações: escolhemos a vingança violenta contra o mundo ou uma vida consagrada a lamber nossas feridas. Ou, ainda, a coragem de ir em frente.
Em matéria de psicologia clínica, vale um ditado que ouvi pouco tempo atrás, no norte rural do estado de Nova York. Diz assim: “Não há como arregaçar as mangas se você continua apontando seus dedos aos outros para culpá-los”.
(Adaptado de CALLIGARIS, Contardo. Terra de ninguém. São Paulo: Publifolha, 2004, p. 238-239)
As normas de concordância verbal estão plenamente observadas na frase: