( PROPOSTA DE REDAÇÃO )
No último dia 20 de julho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o chamado Estatuto da Igualdade Racial, o qual é uma lei que pretende estabelecer ações afirmativas para corrigir desigualdades raciais e promover igualdade de oportunidades a todos os cidadãos. Por considerar a desigualdade social como oriunda do tratamento diferente fundamentado na discriminação étnico-racial, a referida lei faz emergir antigas polêmicas.
Sobre esse assunto, leia a coletânea de textos a seguir.
TEXTO 1
Art. 1º – Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.
Parágrafo único. Para efeito deste Estatuto, considera-se:
I – discriminação racial ou étnico-racial: toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada.
BRASIL. Lei n. 12.288, de 20 de julho de 2010. Estatuto da Igualdade Racial. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007- 2010/2010/Lei/L12288.htm>. Acesso em: 24 ago. 2010.
TEXTO 2
A Constituição Brasileira de 1988 é antirracista e define a nação em termos não raciais. No artigo 3º, entre os objetivos fundamentais da República, aparece a promoção do “bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. No artigo 4º, entre os princípios que regem o Brasil nas suas relações internacionais, encontra-se o “repúdio ao terrorismo e ao racismo”. No artigo 5º, define-se a prática do racismo como “crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos das leis”. Nada, no texto constitucional, admite a posição de leis raciais.
MAGNOLI, Demétrio. Uma gota de sangue: história do pensamento racial. São Paulo: Contexto, 2009. p. 370.
TEXTO 3
Deveríamos nos indagar criticamente sobre as desigualdades raciais e sua imbricação com as desigualdades sociais. Várias pesquisas revelam que raça e classe estão imbricadas. Portanto, já é hora de os educadores superarem o discurso de que o negro é discriminado somente porque é pobre e de que as políticas universais atingem igualmente negros e brancos. É preciso conhecer as pesquisas que nos ajudam a compreender melhor essa situação. Há dados recentes do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) sobre a questão socioeconômica, racial e de gênero dos brasileiros que precisamos conhecer e compreender. Se não tivermos ações afirmativas sérias no Brasil, as desigualdades raciais e o racismo se arrastarão ainda por muitos anos.
GOMES, Nilma Lino. Por uma cidadania multicultural. Entrevista concedida a Rosângela Guerra. Presença pedagógica, V. 14. n. 84. nov./dez. 2008. p. 10.
TEXTO 4
A sociedade atual não tem nenhuma dívida com a época da senzala. Não pode esta sociedade, que não vivenciou ou participou da época do pelourinho escravocrata lusitano no Brasil, continuar sendo chamada para rever ou pagar injustiças passadas e cometidas contra o negro africano aqui introduzido. Ora, a sociedade atual cognominada "branca" não açoitou nenhum negro no passado. Todos os cidadãos brasileiros, pobres, padecem da mesma forma de segregação. Não é com a instituição de um estatuto racial legal que será corrigido um grave problema de ordem social do negro no Brasil. O Estatuto da Igualdade Racial é mais um desses instrumentos jurídicos extravagantes. Assim como há o negro pobre, também existem as classes pobres de brancos, índios, mamelucos etc. O estado atual de pobreza ou de diversidade social do negro é culpa exclusiva de uma má política pública que descumpre a Constituição Brasileira. Assim, no Brasil, o que falta são políticas afirmativas multirraciais de inclusão social de todos nos diversos segmentos da vida cultural, social e produtiva brasileira.
CARDOSO, Julio César. A questão é racial ou social? Disponível em: <http://www.roraimaemfoco.com/colunistas/opinimainmenu 50/17470-artigo-a-questao-eracial-ou-social-julio-cesar-cardoso>. Acesso em: 13 set. 2010. (Adaptado).
TEXTO 5
Quando você for convidado pra subir no adro
Da fundação Casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos
Dando porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos e outros quase brancos
Tratados como pretos
Só pra mostrar aos outros quase pretos
(E são quase todos pretos)
E aos quase brancos pobres como pretos
Como é que pretos, pobres e mulatos
E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados
VELOSO, Caetano; GIL, Gilberto. Haiti. Disponível em: <http://letras.terra.com.br?caetano-veloso/444730/>. Acesso em: 14 set. 2010.
TEXTO 6
As desigualdades raciais que refletem diferenciais de renda, saúde, emprego, educação etc. entre brancos, de um lado, e pretos e pardos, de outro, são gritantes e estão muito bem documentadas. E esse é o modo como, no mundo atual, a sociologia e as instituições internacionais definem o racismo. Não é pelas intenções, pelas doutrinas ou pela consciência racial, mas pelo resultado de uma miríade de ações e omissões. Como funciona o nosso “racismo como consequência”? Desde os anos de 1940 não classificamos por raça, mas por cor. Não acreditamos em grupos de descendência chamados “raças”. Os nossos “grupos de cor” são abertos, podem se alterar de geração a geração, podem conviver com certa mobilidade individual. São classes, no sentido weberiano. Temos e cultivamos, portanto, classes de cor. Mas, apesar de fronteiras incertas para o olhar europeu, não há dúvidas de que pessoas e famílias no Brasil pertencem a classes de cor bem determinadas, se fixarmos um momento no tempo. “Cores” são tão socialmente construídas quanto as “raças” e delas derivadas. Discriminamos abertamente as pessoas por classe de cor ou de renda, por local de nascimento ou aparência física etc. Todas essas discriminações são feitas em muito boa consciência porque não acreditamos em “raças”.
GUIMARÃES, Antonio Sérgio Alfredo. O racismo como conseqüência. Folha de S. Paulo. São Paulo, 18 nov. 2006. p. A3. (Adaptado).
TEXTO 7
Que importa? É lá desgraça?
Essa história de raça,
Raças más, raças boas
– Diz o Boas –
É coisa que passou
Com o franciú Gobineau.
Pois o mal do mestiço
Não está nisso.
Está em causas sociais,
De higiene e outras que tais:
Assim pensa, assim fala
Casa Grande & Senzala.
BANDEIRA, Manuel. “Casa grande & senzala”. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1990. p. 397
TEXTO 8
Honrado Amigo Marquez das Minas.
Eu, o Rei, vos envio com apreço muitas saudações.
Informado fui de que os moços pardos dessa cidade, mesmo estando interessados há muitos anos em estudar nas escolas públicas do Colégio dos Religiosos da Companhia, mais uma vez foram excluídos; não quiseram admiti-los. Todavia, isso não ocorre nas escolas de Évora e Coimbra, nas quais esses moços são admitidos sem que a cor de pardo lhes sirva de impedimento. Nesse sentido, pediram-me que mandasse que os tais religiosos os admitissem nas suas escolas desse Estado, como o são nas outras do Reino. Cabe a mim, portanto, ordenar-vos (como por meio desta o faço) que informeis aos padres da Companhia que os mesmos são obrigados a ensinar nas escolas desse Estado sem excluir os moços geralmente pela qualidade de pardos, porque as escolas de ciências devem ser igualmente comuns a todo gênero de pessoas sem exceção alguma.
Lisboa, aos 20 de novembro de 1686. D. João IV, Rei de Portugal.
D. JOÃO IV. Carta ao Marquez das Minas. In: FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala. 46. ed. Rio de Janeiro: Record, 2002. p. 467. (Adaptado).
Com base na leitura dos textos acima, que você deverá discutir a seguinte questão-tema:
A igualdade de oportunidades e as diferenças socioeconômicas poderão ser resolvidas com a criação de leis raciais?
CARTA ARGUMENTATIVA
A carta de leitor é um gênero textual comumente argumentativo que circula em jornais e revistas e tem como objetivo emitir um parecer de leitor sobre matérias e opiniões diversas publicadas nesses meios de comunicação.
Considerando a definição desse gênero textual, a leitura dos textos da coletânea e, ainda, suas experiências pessoais, escreva uma carta de leitor a um jornal ou a uma revista de circulação nacional, defendendo o seu ponto de vista – contrário, favorável ou outro que transcenda esses posicionamentos – sobre a questão-tema desta prova.