Questão
Universidade Estadual Paulista - UNESP
2004
1ª Fase
PROPOSTA-REDACA12301c97fdb3
Discursiva
(PROPOSTA DE REDAÇÃO)

INSTRUÇÃO: Leia os textos e trechos seguintes.

Samba do Approach 
 
Venha provar meu brunch 
 
Saiba que eu tenho approach 
 
Na hora do lunch 
 
Eu ando de ferryboat 
 
Eu tenho savoir-faire 
 
Meu temperamento é light 
 
Minha casa é hi-tech 
 
Toda hora rola um insight 
 
Já fui fã do Jethro Tull

Hoje me amarro no Slash 
 
Minha vida agora é cool 
 
Meu passado é que foi trash 
 
Fica ligada no link 
 
Que eu vou confessar my love 
 
Depois do décimo drink 
 
Só um bom e velho Engov 
 
Eu tirei o meu green card 
 
E fui pra Miami Beach 
 
Posso não ser pop star 
 
Mas já sou um nouveau riche 
 
Eu tenho sex appeal 
 
Saca só meu background 
 
Veloz como Damon Hill 
 
Tenaz como Fittipaldi 
 
Não dispenso um happy end 
 
Quero jogar no dream team 
 
De dia um macho man 
 
E de noite drag queen.

(Zeca Baleiro. Perfil, CD 3105-2, Som Livre, 2003.) 

Estrangeirismos na publicidade

Porte cochère. Porteiro. Sistema de manobrista. Pórtico Monumental de Entrada. Central de Segurança. Concierge. Recepcionistas. Mensageiros. Sistema de Chauffeur. Upper Deck. Chill-Out. Snack-Bar. Restaurante. Vignerie. Sommelier. Espaço Gourmet Reservado. Sala de Ginástica. Lounge Fitness –Piscina. Spa Fitness. Spa Massagem. Copa/Bar Fitness. Fechaduras com Cartão Magnético. Room Service. Sistema de limpeza e faxina dos apartamentos. Cofres individuais. 

(Palavras e expressões empregadas como legendas de imagens na publicidade, em jornal, de um condomínio de apartamentos de luxo.) 

Justificação

A História nos ensina que uma das formas de dominação de um povo sobre outro se dá pela imposição da língua. Por quê? Porque é o modo mais eficiente, apesar de geralmente lento, para impor toda uma cultura –seus valores, tradições, costumes, inclusive o modelo socioeconômico e o regime político. 

Foi assim no antigo oriente, no mundo greco-romano e na época dos grandes descobrimentos. E hoje, com a marcha acelerada da globalização, o fenômeno parece se repetir, claro que de modo não violento; ao contrário, dá-se de maneira insinuante, mas que não deixa de ser impertinente e insidiosa, o que o torna preocupante, sobretudo quando se manifesta de forma abusiva, muitas vezes enganosa, e até mesmo lesiva à língua como patrimônio cultural. 

De fato, estamos a assistir a uma verdadeira descaracterização da língua portuguesa, tal a invasão indiscriminada e desnecessária de estrangeirismos –como “holding”, “recall”, “franchise”, “coffe-break”, “selfservice” –e de aportuguesamentos de gosto duvidoso, em geral despropositados –como “startar”, “printar”, “bidar”, “atachar”, “database”. E isso vem ocorrendo com voracidade e rapidez tão espantosas que não é exagero supor que estamos na iminência de comprometer, quem sabe até truncar, a comunicação oral e escrita com o nosso homem simples do campo, não afeito às palavras e expressões importadas, em geral do inglês norte-americano, que dominam o nosso cotidiano, sobretudo a produção, o consumo e a publicidade de bens, produtos e serviços, para não falar das palavras e expressões estrangeiras que nos chegam pela informática, pelos meios de comunicação de massa e pelos modismos em geral.

(Aldo Rebelo. Justificação ao Projeto de Lei 1676, de 1999, que dispõe sobre a promoção, a defesa e o uso da língua portuguesa, e dá outras providências.) 

A lei do “rato”

Como poderia dizer o comunista autor da ideia, um espectro ronda a liberdade de expressão. Seu nome é Lei Aldo Rebelo da Língua Portuguesa. 

Apresentada em 1999, essa praga caminha lentamente, como um cupim. Sem que ninguém se dê conta, vai cavoucando seu caminho por dentro do Congresso. Aprovada no Senado, na quarta-feira passada passou por unanimidade na Comissão de Educação da Câmara. 

Se essa aberração vingar, os meios de comunicação terão de seguir uma regra: “Toda palavra ou expressão escrita em língua estrangeira e destinada ao conhecimento público no Brasil virá acompanhada, em letra de igual destaque, do termo ou da expressão vernacular correspondente em língua portuguesa”.

Os jornais precisariam, em tese (essa lei não vai pegar), escrever “rato” entre parênteses depois de “mouse” para descrever o equipamento usado nos computadores. Haverá “sanções administrativas cabíveis” para quem descumprir as novas regras. 

Esse é o tipo de ovo de serpente do qual qualquer democrata deveria se distanciar. Hoje, querem que a imprensa escreva rato para descrever um prosaico mouse. Daqui a pouco terão ideias sobre o que pode ser divulgado pelos jornais. 

Essa não deve ter sido a intenção de Aldo Rebelo –deputado do PC do B de São Paulo, líder do governo na Câmara e uma das pessoas mais educadas e cultas daquela Casa. Ocorre que seu projeto pavimenta um caminho perigoso contra a livre expressão de ideias no país.

No fundo, a motivação de Rebelo é singela: “Tive uma ideia, vou fazer uma nova lei”. Há uma obsessão cartorial-católica-lusitana no Brasil pela regra escrita, carimbada. 

Rebelo quer proteger o idioma. Tudo bem. Mas é inútil uma lei para isso. Bastaria o governo erradicar o analfabetismo e garantir escolas de qualidade. Aí, é claro, fica difícil. 

(Fernando Rodrigues. Folha de S. Paulo, 1º.09.2003.) 

O estrangeirismo

Concluamos pois. O estrangeirismo é um fenômeno natural, que revela a existência duma certa mentalidade comum. Os povos que dependem econômica e intelectualmente de outros não podem deixar de adotar, com os produtos e ideias vindas de fora, certas formas de linguagem que lhes não são próprias. O ponto está em não permitir abusos e limitar essa importação linguística ao razoável e necessário. Contido nestes limites, o estrangeirismo tem vantagens: aumenta o poder expressivo das línguas, esbate a diferença dos idiomas, tornando-os mais compreensivos, e facilita, por isso mesmo, a comunicação das ideias gerais. 

(M. Rodrigues Lapa. Estilística da Língua Portuguesa. 4.a ed. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1965.)

PROPOSIÇÃO

A língua portuguesa está em perigo, em virtude do uso indiscriminado de palavras estrangeiras? É fenômeno passageiro, sem consequências? À invasão dos vocábulos se seguirá a do próprio idioma estrangeiro, depois a de sua cultura e depois ainda a desse próprio país? Deve-se regulamentar o uso de palavras e expressões estrangeiras por meio de uma lei? Deve-se deixar que o relacionamento entre a Língua Portuguesa e as demais línguas siga o curso natural ditado pelo relacionamento entre os povos? 

Tomando por base, se achar necessário, os textos apresentados, bem como sua própria experiência pessoal a respeito, escreva uma redação em prosa, de gênero dissertativo, sobre o tema: 

OS ESTRANGEIRISMOS NA LÍNGUA PORTUGUESA.