Questão
Universidade Estadual de Roraima - RR - UERR
2023
Fase Única
VER HISTÓRICO DE RESPOSTAS
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[Quanto] à questão da incorporação dos pobres pelo romance de 30, é preciso acrescentar que uma abertura desse tipo coloca para o intelectual, oriundo geralmente das classes médias ou de algum tipo de elite decaída, o problema de lidar com um outro. Esse problema foi vivido em profundidade pelos autores daquela década e bem ou mal resolvido de várias maneiras diferentes. (...) Para Graciliano, como se vê, o roceiro pobre é um outro, enigmático, impermeável. Não há solução fácil para uma tentativa de incorporação dessa figura no campo da ficção. E lidando com o impasse, ao invés das fáceis soluções, que Graciliano vai criar Vidas Secas, elaborando uma linguagem, uma estrutura romanesca, uma constituição de narrador, um recorte de tempo, enfim, um verdadeiro gênero a se esgotar num único romance, em que narrador e criaturas se tocam, mas não se identificam. Em grande medida, o impasse acontece porque, para a intelectualidade brasileira daquele momento, o pobre, a despeito de aparecer idealizado em certos aspectos, ainda é visto como um ser humano meio de segunda categoria, simples demais, incapaz de ter pensamentos demasiadamente complexos — lembre-se que a crítica achou inverossímil que Paulo Honório fosse o narrador de S. Bernardo. O que Vidas Secas faz é, com um pretenso não envolvimento da voz que controla a narrativa, dar conta de uma riqueza humana de que essas pessoas seriam plenamente capazes.

Luís Bueno. Guimarães, Clarice e antes. In: Teresa. Revista de Literatura Brasileira, São Paulo, n. 2, ed. 34, p. 255-256, 2001.

Analisando-se o caso específico do romance de 30 e os elementos gerais do Modernismo brasileiro quanto à questão da representação das classes populares pelos intelectuais, é possível afirmar, com base no texto precedente, que, em Vidas Secas, de Graciliano Ramos,
A
as estruturas narrativas seguem a linha do romance proletário de Jorge Amado, cuja perspectiva política engajada se reflete na composição do romance pela identificação imediata entre autor e povo.
B
tal como na obra do modernista Oswald de Andrade, a adoção de uma linguagem simples, pulsante e semelhante à língua falada aproxima o narrador das classes populares.
C
o autor se identifica com o personagem popular graças à reinvenção da língua do povo expressa em neologismos esteticamente refinados, a exemplo do que fez Guimarães Rosa.
D
à semelhança de Os sertões, de Euclides da Cunha, a perspectiva do narrador é a do observador culto e distanciado da visão de mundo limitada atribuída ao sertanejo inculto.
E
a distância entre autor e personagens populares é problematizada; assim, a perspectiva única do autor não prevalece e manifesta-se a riqueza humana real que constitui os personagens.