Que adianta o negro ficar olhando para as bandas do Mangue ou para os lados da Central? Madureira é longe e a amada só pela madrugada entrará na praça, à frente do seu cordão.
Se o negro soubesse que luz sinistra estão destilando seus olhos e deixando escapar como as primeiras fumaças pelas frestas de uma casa onde o incêndio apenas começou! Todos percebem que ele está desassossegado, que uma paixão o está queimando por dentro. Mas só pelo olhar se pode ler na alma dele [...].
O que o está torturando é ideia de que a presença dela deixará a todos de cabeça virada, e será a hora culminante da noite. Ele até conversa com o namorado futuro assassino, como se quisesse dissuadi-lo do crime.
Por que não se incorporou ao seu bloco? E por que não está dançando? Há pouco não passou uma morena que o puxou pelo braço, convidando-o? Era a rapariga do momento, devia tê-la seguido... Ah, negro, não deixes a alegria morrer... É a imagem da outra que não tira do pensamento, que não lhe deixa ver mais nada. Afinal, a outra não lhe pertence ainda, pertence ao seu cordão; não devia proibi-la de sair. Pois ela já não lhe dera todas as provas? Que tenha um pouco de paciência: aquele corpo já lhe foi prometido, será dele mais tarde.
Andar na praça assim, todos desconfiam. Quanto mais agora, que estão tocando o seu samba. Está sombrio, inquieto, sem ouvir a sua música, na obsessão de que a amada pode ser de outrem, se abraçar com outro.
MACHADO, Aníbal. A morte da porta-estandarte, Tati, A garota e outras histórias. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/livrariadafolha/2014/01/1400227-leia-trecho-de-a-morte-da-porta-estandarte-de-anibal-machado.shtml> Acesso em 26/01/2022.
Na sequência das ações, a porta-bandeira será assassinada pelo namorado ciumento; o leitor já consegue antever esses fatos, porque