Questão
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC - MG
2011
Fase Única
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RESPONDA COM BASE NO TEXTO ABAIXO, EXTRAÍDO DO LIVRO AI DE TI COPACABANA, DO CRONISTA BRASILEIRO RUBEM BRAGA

ÁRVORE 

Alta, muito alta, e branca, muito branca, de olhos verdes... Sonhei ter visto uma jovem assim? Terei sonhado ou sonhei que sonhava; não sei; essa moça devia ser irmã da árvore, que vi a vez primeira em noite de luar, erguendo para a noite azul os seus galhos unânimes. Mas de manhã, quando abri a janela, e o sol nascia sobre a Cordilheira, é que ela esplendeu em toda sua beleza.

Em muitos caminhos da Europa e do sul do Brasil vi essa árvore; é um álamo, e foram os álamos que inventaram todas as alamedas desse mundo. Em minha rua santiaguina também há muitos; mas o mais alto de todos, o mais forte em viço, em beleza, está junto à calçada, no meu jardim.

Sou um homem confuso e distraído; minha rua chama-se Roberto Del Río e na primeira madrugada, quando voltava para casa, disse ao chofer que morava em Roberto Del Mar. O velho chileno riu muito dentro de seu casaco escuro, atrás de seus bigodes brancos; mas quando chegamos à rua e ele me perguntou o número da casa não precisei puxar meu caderno de endereços para responder; apontei a mais de cem metros o meu álamo real.

Nenhuma árvore se lança com tanta veemência para o alto; lança-se o enorme tronco muito branco, lançam-se todos os galhos cobertos de folhas, num impulso de chama verde, vinte jatos de seiva partindo todos para cima, ao longo da mesma reta vertical.

Há um pinheiro estático e extático, há grandes salso-chorões derramados para o chão, e a graça menina de uma cerejeira cor de vinho, que o sol acende e faz fulgurar; mas o álamo junto do portão tem um vigor e uma pureza que me fazem bem pela manhã, como se toda manhã, ao abrir a janela, eu visse uma jovem imensa, muito clara, de olhos verdes, de pé, sorrindo para mim. 

Santiago, abril, 1955

Leia o comentário, do crítico Davi Arrigucci Júnior: 

“A crônica se situa bem perto do chão, no cotidiano da cidade moderna, e escolhe a linguagem simples e comunicativa, o tom menor do bate-papo entre amigos, para tratar das pequenas coisas que formam a vida diária, onde às vezes encontra a mais alta poesia. É exatamente essa a situação preferida das crônicas de Rubem Braga.”

Relacionando o comentário do crítico ao texto lido, é INCORRETO afirmar que
A
ao associar a beleza do álamo à beleza de uma jovem mulher, o cronista trata de “coisas que integram a vida diária”, convertendo-as em poesia, tal como prevê o crítico.
B
a referência ao motorista chileno é, dentre outros, um indício de que “Árvore” focaliza o cotidiano de uma cidade moderna.
C
a simplicidade da linguagem a que se refere Arrigucci é constatável em todo o texto de Braga.
D
ao mencionar o “tom menor do bate-papo entre amigos”, o crítico se refere ao emprego de diálogos, tais como o do narrador com o motorista de táxi em “Árvore”.