SOMATÓRIA
“Aos missionários à quem o arcebispo Dr. Fr. João da Madre de Deus recomendava muito as vias sacras, que enchendo a cidade de cruzes, chamavam do púlpito as pessoas por seus nomes, repreendendo à quem faltava.”
SONETO
Via de perfeição é a sacra via,
Via do Céu, caminho da verdade:
Mas ir ao Céu com tal publicidade,
Mais que à virtude, o boto à hipocrisia.
O ódio é d’alma infame companhia,
A paz deixou-a Deus à cristandade:
Mas arrastar por força, uma vontade,
Em vez de perfeição é tirania.
O dar pregões do púlpito é indecência,
Que de fulano? venha aqui sicrano:
Porque o pecado, o pecador se veja:
É próprio de um Porteiro d’audiência,
E se nisto maldigo, ou mal me engano,
Eu me submeto à Santa Madre Igreja.
(MATOS, G. de. Antologia. Porto Alegre: L&M Pocket, 2009, p. 78-79)
Vocabulário
- Dar pregões do púlpito: equivale a pregar sermões na tribuna da Igreja, o lugar mais alto, o que representava a aproximação do Deus celestial.
- Que de fulano: equivale a “Cadê fulano?”
- boto: verbo “botar”, atribuir (primeira pessoa, singular, no presente do indicativo).
- infame: desonrada.
Assinale o que for correto.
01) A crítica de cunho moral em relação ao comportamento dos missionários é evidente. Para o eu lírico, o pecado não consiste em se ausentar da via sacra, e sim em constranger, publicamente, a pessoa ausente.
02) A hipocrisia, a tirania e a indecência como defeitos morais nos missionários explica a razão pela qual o poeta ignorou o clero e seus hábitos. A falsidade do clero fez que ele se afastasse da Igreja, que raramente aparece em sua produção.
04) “Mas ir ao Céu com tal publicidade” (terceiro verso da primeira estrofe) é uma ironia. O acesso ao paraíso cristão se dá por meio da prática da virtude, que não visa a ser exibida publicamente.
08) O eu lírico exalta os missionários que promoviam as vias sacras quando os chama de “Porteiro d’audiência”. Nesse caso, os religiosos são comparados a São Pedro, o santo que, popularmente, é conhecido como Porteiro do Céu.
16) A censura moral no poema refere-se aos padres que não cumpriam a contento a sua função. A presença do elemento sagrado e religioso era tão forte na produção poética de Gregório de Matos que essa vertente da sua lírica ficou conhecida como “poesia sacra”.