Questão
Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG
2019
Fase Única
SOMATORIA-pec-Vestido5225682f605
Discursiva
(SOMATÓRIA)

A respeito da peça Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, assinale o que for correto.

01) As rubricas, indicações cênicas colocadas pelo autor como forma de condução da peça, no caso de Vestido de noiva são absolutamente importantes, seja na dimensão textual ou na da encenação. No caso do texto, o conflito dramático só faz sentido (embora não seja simples a sua compreensão) por causa das rubricas, que operam uma função semelhante à de um narrador, que, em uma narrativa convencional, necessitaria de onisciência e de grande versatilidade para transitar entre os planos de consciência e da realidade de modo verossímil.

02) A cocote Clessi representa como que um alter ego dentro da consciência da acidentada. Transitando pelos planos da alucinação e da memória, Clessi desempenha uma função de ordenação e de recuperação progressiva da memória, pois perquire e repreende a protagonista frente às constantes confusões, omissões e/ou incoerências de Alaíde. Como neste trecho do Segundo Ato: “Clessi – Você parece maluca!

Alaíde – (ao lado de Clessi) – Eu?

Clessi – Você está fazendo confusão! Casamento com enterro!... Moda antiga com moda moderna! Ninguém usa mais aquele chapéu com plumas, nem aquele colarinho!”. (RODRIGUES, 2012, p.53).

04) No fim do Primeiro Ato, durante os preparativos do casamento de Alaíde, temos a seguinte cena:

“D. Laura – Desculpe. Eu não tinha visto você. (Pausa para uma resposta que ninguém ouve.)

D. Laura (risonha) – Quando é o seu? (Pausa para outra resposta.)

D. Laura (maliciosa) – Qual o quê? Está aí, não acredito! Tão moça, tão cheia de vida”.

Já no Segundo Ato, temos a mesma cena, agora com outros detalhes:

“D. Laura – Desculpe. Eu não tinha visto você. Mulher de véu – Não faz mal.

D. Laura (risonha) – Quando é o seu?

Mulher de véu – Tem tempo! (noutro tom) (com certa amargura) Nunca!

D. Laura (maliciosa) – Qual o quê? Está aí, não acredito! Tão moça, tão cheia de vida”. (RODRIGUES, 2012, p.33) 

Fica claro que as lacunas de memória são estritamente artifícios literários para que se mantenha o mistério com relação à identidade da personagem, que depois se revelará como sendo Lúcia, a irmã da protagonista.

08) No Primeiro Ato, Alaíde, falando desde o plano da memória, descreve a morte de Pedro assim:

“Voz de Alaíde (microfone) – Eu bati aqui detrás, acho que na base do crânio. Ele deu arrancos antes de morrer, como um cachorro atropelado.

Voz de Clessi (microfone) – Mas como foi que você arranjou o ferro?

Voz de Alaíde (microfone) – Sei lá! Apareceu! (noutro tom) Às vezes penso que ele pode estar vivo! Não sei de nada, meu Deus! Nunca pensei que fosse tão fácil matar um marido” (RODRIGUES, 2012, p.27).

Até o fim da peça, em função das alucinações e lacunas de memória de Alaíde, há uma ambiguidade a respeito dos fatos acima descritos. Não há como afirmar se houve homicídio ou não.

16) A peça Vestido de noiva, com primeira montagem em 1943, é tida pelos críticos como referência de experimentalismo no teatro brasileiro. O modo como a aparição dos personagens, as rubricas, as ações e diálogos dos três planos saem da consciência atormentada e moribunda de Alaíde torna a dinâmica da peça completamente atrelada às vicissitudes dos estados interiores da protagonista.