SOMATÓRIA
Sobre o poema de Drummond, inicialmente publicado em O sentimento do mundo (1940), assinale o que for correto.
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.
ANDRADE, C. D. “Mãos dadas”. In: Antologia poética – Carlos Drummond de Andrade, 2015.
01) O eu poético propõe a união entre os homens. Apesar de a Segunda Guerra Mundial continuar seus lastros de morte, o poeta não tece desesperanças, mostrando-se engajado e pronto a se juntar a seus semelhantes: “Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas”. Sua matéria é o hoje e, ao contrário do artista idealizador, procura vivenciar seu tempo: “O presente é tão grande, não nos afastemos”.
02) Neste verso: “Entre eles, considero a enorme realidade”, o eu lírico mostra como os homens perderam a motivação na vida, estão cabisbaixos e “taciturnos”, como ainda comprova o verso: “Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças”. Assim, desiludidos, os homens caminham para o tempo futuro e olham-no como um espaço de fuga onde poderão andar de mãos dadas, como sugere o título do poema.
04) Na segunda estrofe, o eu lírico rechaça qualquer tipo de poesia que fale do tempo vindouro. O advérbio de negação que antecede cada um dos verbos no futuro: “serei”, “direi”, “distribuirei”, “fugirei” aponta para o compromisso com o tempo presente, evitando qualquer tipo de alienação que possa ligar o eu lírico a outra realidade temporal que não seja o de sua vivência atual. Nesse sentido, o eu lírico assume o compromisso de estar atento a tudo que ocorre à sua volta e à vida presente.
08) O primeiro verso (“Não serei o poeta de um mundo caduco.”) representa, no contexto estético de produção do poema, uma crítica aos poetas parnasianos, que cantavam musas e temas clássicos, distantes da realidade econômica e social de seu tempo. O sintagma “mundo caduco”, portanto, refere-se ao passado e, também, ao conteúdo e à forma utilizados pelos poetas que se recusavam a vivenciar o olhar contemporâneo.
16) Há uma clara recusa de Drummond em cantar os temas cotidianos. Na época da publicação de “Mãos dadas”, o poeta ainda se mostrava resistente à proposta poética do Modernismo, adotando o rigor métrico.