A Sabedoria das Árvores
Existe no Sahel, região africana de transição entre a savana e o deserto, uma árvore conhecida pelos hauçás como gao. Para nós, do Brasil, é uma acácia. Em seu livro A geografia da pele, o agrônomo Evaristo de Miranda descreve seus dez anos de trabalho na região e relata que o gao é uma espécie de árvore do contra, capaz de subverter o padrão normativo do grupo.
Na estação das chuvas, quando o verde toma conta da vegetação e as árvores vivem a florada esplendorosa, o gao perde as folhas, se acinzenta, murcha adormecido. Quando, todavia, a seca chega e a estiagem é inclemente, só essa acácia esverdeia, florescendo exuberante em meio ao cinza que parece mundo morto.
Os africanos do Sahel veneram o gao, visto como uma árvore sagrada, silenciosa e capaz de ensinamentos prodigiosos, inclusive para a conduta das comunidades. A acácia africana tem a ousadia de ser cinza quando o que se espera dela é o verde, e de verdejar quando tudo se acinzenta. Nos tempos difíceis, é ela que dá a sombra para os rebanhos e alimenta o gado com as folhas das extremidades de seus galhos.
Os baobás são muito maiores que as acácias. Verdadeiros templos encantados, os hauçás os conhecem como kukas. Em regiões ao sul do Saara, algumas etnias sedentárias chegavam a usar os baobás como túmulos dos griôs, os contadores de histórias responsáveis pela memória ancestral e pela manutenção, desta forma, dos laços de coesão do grupo. O baobá é a árvore da permanência, da ancestralidade e da continuidade da vida pela palavra.
Para os hauçás do Sahel, o equilíbrio entre o padrão normativo do kuka e a ousadia do gao permite a continuidade dinâmica da vida comunitária, em conexão com as Forças Vitais que alimentam incessantemente o ser em sua aventura neste e nos outros mundos.
LOPES, N.; SIMAS, L.A. Filosofias Africanas: uma introdução. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2020. p. 105-106. Adaptado.
a) A partir da leitura do Texto I, explique, com suas próprias palavras, por que a árvore gao, segundo o agrônomo Evaristo de Miranda, é considerada uma árvore do contra.
b) Transcreva, do 2º parágrafo do Texto I, uma palavra derivada pelo mesmo processo de formação da palavra esverdeia.
c) Indique uma palavra que possa ser empregada no lugar da palavra sublinhada abaixo, de modo que haja manutenção do sentido.
Quando, todavia, a seca chega, a acácia africana floresce exuberante