Submissão ao processo
O processo de viver é feito de erros — a maioria essenciais - de coragem e preguiça, desespero e esperança de vegetativa atenção, de sentimento constante (não pensamento) que não conduz a nada, não conduz a nada, e de repente aquilo que se pensou que era “nada” — era o próprio assustador contato com a tessitura do viver — e esse instante de reconhecimento (igual a uma revelação) precisa ser recebido com a maior inocência, com a inocência de que se é feito. O processo é difícil? Mas seria como chamar de difícil o modo extremamente caprichoso e natural como uma flor é feita. (Mamãe, disse o menino, o mar está lindo, verde e com azul e com ondas! está todo anaturezado! todo sem ninguém ter feito ele!) A impaciência enorme (ficar de pé junto da planta para vê-la crescer e não se vê nada) não é em relação à coisa propriamente dita, mas à paciência monstruosa que se tem (a planta cresce de noite). Como se se dissesse: “não suporto um minuto mais ser tão paciente”, “essa paciência de relojoeiro me enerva” etc.: é uma impaciente paciência. Mas o que mais pesa é a paciência vegetativa, boi servindo ao arado.
(Clarice Lispector)
O texto de Clarice Lispector, aqui analisado, apresenta elementos típicos de que gênero textual?