TEXTO 04
Ou isso ou aquilo; se este ou se aquele, alternativas e condicionais, entre uma e outra traço minha história de vida. História! Apenas luto para fixar-me no espaço. Quando chegar o dia em que eu possuir minha casa, literalmente falando, com mangueiras seculares, com jardins a enfeitar-me os dias, eu voltarei ao reino cósmico, à unidade perdida. Porém, o meu reino é o da imaginação, ali domino soberana, rainha sem rival. Se admito alguns inimigos é apenas para animar o cenário e, principalmente, os bastidores. Eles pensam que chegam sorrateiros e vão felizes minando o campo, param somente para contemplar seu rastro de destruição. A surpresa é ver que tudo permaneceu intacto: a casa, as árvores, as flores, o cachorro e o coração. Nada mudou. Sem entender, o rival não se dá por vencido. ‘Dignamente’ retorna e recomeça sua ação nefasta.
O homem luta ferozmente pela supremacia, demônio com seu hálito mortífero. Cumprimento-o com amabilidade, ele me abraça desdenhoso e me enfrenta diuturnamente, como a luta surda e muda da doméstica com a patroa. O problema não é de moral convencional ou de falsa moral, mas, sim, de ter diante de si o protótipo do selvagem homem capitalista e, antes disso, vítima de suas ambições mesquinhas.
(MARTINS, Maria Teresinha. Rapto de Memória. 2. ed. Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2010. p. 43.)