TEXTO 1: Relato do historiador romano Tácito (XIV, 17) de um incidente ocorrido em 59 d.C.
Um incidente sem importância provocou uma horrível matança entre os colonos de Nucéria e Pompeia. Aconteceu durante um combate de gladiadores oferecido por Livônio Régulo. Como ocorre comumente em pequenas cidades, trocaram-se insultos, em seguida, pedras, chegando-se, por fim, às espadas. A plebe de Pompeia, onde se realizava o espetáculo, levou a melhor. Muitos nucerianos, feridos e mutilados, eram levados para sua cidade. Muitos choravam a morte de um filho ou um pai. O príncipe (Nero) instruiu o Senado para investigar o caso. O Senado deixou-o a cargo dos cônsules. Quando recebeu as informações, o Senado proibiu, por dez anos, a realização, por parte de Pompeia, de reuniões daquele tipo (jogos de gladiadores), e as associações legais (torcidas organizadas) foram dissolvidas. Livônio e seus cúmplices na desordem foram exilados.
TEXTO 2: Crônica de Nelson Rodrigues.
Nós, os mortais
Amigos, é certo que houve o diabo, anteontem, no Maracanã. Poucas vezes, desde que me conheço, tenho visto uma partida tão truculenta. Foi pé na cara de fio a pavio do jogo. E quando soou o apito final, só uma coisa admirou: é que ninguém tivesse saído de maca ou rabecão.
Mas o futebol é muito divertido. À saída do estádio, só vi gente vociferando contra a indisciplina. Um sujeito fazia uma espécie de comício. Dizia, de olho rútilo e lábio trêmulo: “Isso é uma vergonha!”. Fazia o suspense de uma pausa e reforçava: “Uma pouca-vergonha!”. Só eu no meio de tantos, de todos, não estava nada irado, nada ultrajado. Sempre que vejo dois times baixarem o pau, concluo, de mim para mim: “Eis o homem”.
Pode ser lamentável e acredito que seja lamentável. Mas, que fazer se é esta, exatamente esta, a condição humana? A rigor, ninguém tem o direito de se espantar com o alheio pecado. O homem sempre foi assim, desde o Paraíso e antes do Paraíso. E nenhum jogador vai para o inferno só porque meteu o pé na cara de outro jogador.
Todos nós temos o fanatismo da disciplina, mas creiam: é um fanatismo suspeito ou, como dizia outro, de araque. A disciplina foi feita para o soldadinho de chumbo e não para o homem. E o futebol tem de ser passional, porque é jogado pelo pobre ser humano. A grandeza de um clássico ou de uma pelada está em que fornece uma imagem fidedigna do homem. Assim somos todos nós.
Quando a multidão vaia um jogador feroz, está agindo e reagindo como um Narciso às avessas que cuspisse na própria imagem. Ninguém é melhor do que ninguém. Se a multidão estivesse no lugar do jogador faria a mesma coisa e, se o jogador estivesse no lugar da multidão, vaiaria do mesmo jeito. Portanto, eu não consigo me escandalizar com a baderna de anteontem.
Eu me espantaria, sim, se, ao ser agredida, a vítima retribuísse com um beijo na testa. Mas se o agredido esperneia, tenho de admitir a lógica do seu comportamento. Há, também, o caso do juiz. A meu lado, um confrade esperneava: “Inconcebível!”. E, de fato, o árbitro fez o diabo. Só faltou subir pelas paredes e se pendurar no lustre de cabeça para baixo. Está certo: S.Sª errou. Mas pergunto: por que cargas d’água só o juiz há de ser o incorrupto, o infalível, se nada disso pertence à condição humana?
Se reis, príncipes, barões cometeram as maiores iniquidades, por que um juiz de futebol há de ser irrepreensível? Se Maria Antonieta fez uma piada sobre a fome; e se pagou essa piada com a cabeça – o árbitro de anteontem pode marcar um pênalti errado. Amigos, a disciplina é uma convenção. E qualquer convenção nasce e existe para ser violada.
Casos de violência no esporte e brigas entre torcidas, como os relatados nos textos 1 e 2, são notícias recorrentes na atualidade. Diante dessas ocorrências, você concorda com a opinião de Nelson Rodrigues? Apresente seu ponto de vista em um texto, atendendo às seguintes recomendações:
- mencionar fatos atuais;
- apresentar argumentos para sustentar sua opinião;
- ter de 8 a 10 linhas.