Texto 1: Eras a sombra no poente
Eras a sombra do poente
Em calmarias bem calmas;
E no ermo agreste, silente,
Palmeira cheia de palmas.
Eras a canção de outrora,
Por entre nuvens de prece;
Palidez que ao longe cora
E beijo que aos lábios desce.
Eras a harmonia esparsa
Em violas e violoncelos:
E como um voo de garça
Em solitários castelos.
Eras tudo, tudo quanto
De suave esperança existe;
Manto dos pobres e manto
Com que as chagas me cobriste.
Eras o Cordeiro, a Pomba,
A crença que o amor renova...
És agora a cruz que tomba
À beira de tua cova.
(Alphonsus de Guimaraens. Poesias – I. Rio de Janeiro: Org. Smões, 1955, p.284.)
Texto 2: Ismália
Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.
No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...
E no desvario seu
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu
Estava longe do mar...
E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...
As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao Céu,
Seu corpo desceu ao mar...
(Alphonsus de Guimaraens. Melhores Poemas. Seleção: Alphonsus de Guimaraens Filho- 4ª Ed. São Paulo: Global, 2001.p.101).
I – O sensorialismo, obtido por meio das sugestões de cor e de som, é bastante expressivo no texto II, mas não é um recurso significativo no texto I.
II – No texto I, especialmente nos três últimos versos, observa-se uma atmosfera lúgubre, reforçando ao tom geral do poema de desistência, de abandono da vida, o que faz lembrar o Romantismo.
III – O tom do texto II é de positividade: a personagem, através da loucura e da morte, atingiu seu objetivo, sendo, inclusive, favorecida por Deus, que se compadece de sua condição.