Questão
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-RJ
2016
Fase Única
Texto-1O-exilio7713197b4cd
Discursiva
Texto 1

O exílio, uma experiência da modernidade

A história da humanidade poderia escrever-se a partir das estórias do exílio porque desde o início o homem tem vivido em permanente opressão e fuga: fuga de si mesmo e dos outros. Também tem 
realizado grandes ações, grandes construções: conquista de terras remotas, fundação de cidades, guia de grandes migrações, descobrimento de continentes, exploração de mares, governo de povos. Todas essas obras “magníficas” em sua grande maioria foram feitas graças ao labor dos refugiados, asilados, prisioneiros de guerra, escravos, todos vítimas da opressão e expulsão. O pensamento estético, acadêmico e científico da moderna cultura ocidental, também tem-se alimentado de fontes estrangeiras, pense-se em tantos pensadores e cientistas degredados e suas valiosas contribuições ao pensamento moderno: Marcuse, Beckett, Nabokov, James Joyce, Adorno, Hannah Arendt, Walter Benjamin, Pound, Einstein, entre outros. Desse ponto de vista, a expulsão e o exílio acabaram sendo condições prévias para o desenvolvimento social e humano. O internacionalismo intelectual e cultural, de grandes convulsões sociais, em que as ideias passavam de uma cultura para outra, gerou uma arte essencialmente cosmopolita que se alimentou das tradicionais viagens literárias e expatriações de muitos escritores e artistas, ou foi causada pelas grandes convulsões históricas que forçaram ao exílio muitos escritores, ocasionando que uma parte tão grande da arte moderna tenha sido produzida por escritores “sem lar”, afastados de sua cultura nacional, sua tradição, seu idioma nativo. Daí que a palavra “moderno” tenha tantas conotações de desarraigamento, desorientação, ironia, alienação, fratura, sentimentos e emoções que fazem com que a arte moderna provoque em nós uma perturbação tão profunda quanto a admiração que nos inspira. Porém, na escala do século XX, o exílio não é compreensível nem do ponto de vista estético, nem do ponto vista humanista. O exílio é – segundo Edward Said (2003) − irremediavelmente secular e insuportavelmente histórico, é produzido por seres humanos para outros seres humanos, é uma condição criada para negar a dignidade e a identidade das pessoas. Nesse sentido o exílio não pode ser posto a serviço do humanismo.

A marca do trauma do exílio fica refletida na perda da identidade, na dor, na fratura e no estranhamento. Por isso, Czeslaw Milosz (1993) afirma que o exílio é a situação existencial do homem moderno. Na modernidade, o homem ainda não superou a desdita de permanecer em permanente desterro. As conquistas de qualquer desterrado são constantemente carcomidas pelo sentimento de estranhamento, de perda. Na realidade, todo exilado é um náufrago que luta por sobreviver num território estranho onde o desespero, a aniquilação e o silêncio se fazem presentes. Existem muitas 
estórias e histórias que apresentam o exílio como uma condição heroica, gloriosa ou romântica, e esquecem, porém, a dor da orfandade oculta em seu interior. No âmago de sua solidão, o exilado sente, 
no silêncio de seu ser, o verdadeiro destino da existência humana. A literatura sobre o exílio objetiva uma angústia e uma condição que a maioria das pessoas raramente experimenta em primeira mão; “mas pensar que o exílio é benéfico para essa literatura é banalizar suas mutilações, as perdas que inflige aos que as sofrem [...]. Para autores como James Joyce, Ezra Pound, Samuel Beckett ou Paul Bowles, o exílio sugere valores mais sedutores, vinculados a estados da consciência, capazes de confirmar qualidades do indivíduo cuja pureza só seria possível a partir de uma conquista solitária de um espaço próprio. Nietzsche, Joseph Conrad, T.S. Eliot, Nabokov, ou Theodor W. Adorno, porém, pertencem a outra tradição de autores que vê o exílio como absoluta orfandade, fratura, trauma, solidão e silêncio. Nessa condição não existe nada glorioso, nem romântico: o exílio é nossa maldição, nossa vocação existencial e nossa natureza; é a representação de uma lei fundamental – a da impossibilidade de comunicação entre quem quer que seja.

Texto adaptado de MONTAÑÉS, Amanda Pérez. Vozes do exílio e suas manifestações nas narrativas de Julio Cortázar e Marta Traba. Tese de Doutorado. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2006. p. 15-16. https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/89324/231627.pdf?sequence=1 Acesso em 29/04/2016.

a) Sem reproduzir passagens do texto 1, explique por que, segundo Amanda Montañés, a palavra“moderno” assume as conotações elencadas no texto.

b) Observe:

i. “Na realidade, todo exilado é um náufrago que luta por sobreviver num território estranho onde o desespero, a aniquilação e o silêncio se fazem presentes.”

ii. Na realidade, todo exilado tem sido um náufrago que luta por sobreviver num território estranho onde o desespero, a aniquilação e o silêncio se fazem presentes.

iii. Na realidade, todo exilado seria um náufrago que luta por sobreviver num território estranho onde o desespero, a aniquilação e o silêncio se fazem presentes.

Comente a diferença de sentido que se estabelece entre as frases acima em decorrência do tempo verbal empregado.