Sobre a miocardite chagásica, considere o seguinte.
I. Embora não haja como realizar vigilância epidemiológica sem considerar todos os elos da cadeia de transmissão e a paisagem onde ocorrem, a maioria absoluta das ações e projetos de vigilância epidemiológica está baseada no levantamento e coleta de triatomíneos em domicílio e peridomicílio, além, é claro, do monitoramento de novos casos da doença de Chagas. No entanto, é preciso lembrar que os triatomíneos (Triatoma infestans) vetores adquirem a infecção por Trypanosoma cruzi se alimentando sobre seus hospedeiros e/ou reservatórios, que podem incluir um número expressivo de espécies de mamíferos. É preciso lembrar, no entanto, que o T. cruzi é um parasita eclético quanto a seus hospedeiros e habitats e é transmitido em redes parasitárias bem estabelecidas em todos os biomas do país e que este é um aspecto que deve ser incluído nas ações de vigilância sanitária.
II. Febre, mal-estar, inflamação e dor nos gânglios, vermelhidão, inchaço nos olhos (sinal de Romaña), aumento do fígado e do baço são os principais sintomas. Com frequência, a febre desaparece depois de alguns dias, e a pessoa não se dá conta do que lhe aconteceu, embora o parasita já esteja alojado em alguns órgãos. Como nem sempre os sintomas são perceptíveis, o indivíduo pode saber que tem a doença, 20, 30 anos depois de ter sido infectado, ao fazer um exame de sangue de rotina. Meningite e encefalite são complicações graves da doença de Chagas na fase aguda, mas são raros os casos de morte.
III. Caindo na circulação, o Trypanosoma cruzi afeta os gânglios, o fígado e o baço. Depois se localiza no coração, intestino e esôfago. Nas fases crônicas da doença, pode haver destruição da musculatura e sua flacidez provoca aumento desses três órgãos, o que causa problemas como miocardite chagásica, megacólon (aumento do cólon que pode provocar retenção das fezes) e megaesôfago, cujo principal sintoma é a regurgitação dos alimentos ingeridos. Essas lesões são definitivas e irreversíveis. A doença de Chagas pode não provocar lesões importantes em pessoas que apresentem resposta imunológica adequada, mas pode ser fatal para outras.
IV. A medicação é dada sob acompanhamento médico nos hospitais, devido aos efeitos colaterais que provoca, e deve ser mantida, no mínimo, por um mês. O efeito do medicamento costuma ser satisfatório na fase aguda da doença, enquanto o parasita está circulando no sangue. Na fase crônica, não compensa utilizá-lo mais, e o tratamento é direcionado às manifestações da doença, a fim de controlar os sintomas e evitar as complicações.
V. Desde a década de 1940, os cientistas sabem que a anemia falciforme, uma doença hereditária que causa mutação nos eritrócitos do sangue, protege seus portadores contra a malária e a miocardite. Recentemente esse mecanismo imunitário foi elucidado. Normalmente os protozoários Plasmodium e Trypanosoma usam uma proteína chamada adesina para chegar à parte externa dos glóbulos vermelhos, de onde chegam às paredes dos vasos sanguíneos. A partir daí, provocam os problemas neurológicos e circulatórios ligados à malária e à tripanossomíase americana. Nas pessoas que têm anemia falciforme, esse mecanismo é bloqueado. O protozoários não acessam a parte externa dos glóbulos vermelhos e, por isso, não há infecção.