Questão
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP
2018
Fase Única
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ANULADA
Os ombros suportam o mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração. 
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho. 
E o coração está seco. 

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se, 
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer. 
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice? 
Teus ombros suportam o mundo 
e ele não pesa mais que a mão de uma criança. 
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios 
provam apenas que a vida prossegue 
e nem todos se libertaram ainda. 
Alguns, achando bárbaro o espetáculo, 
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer. 
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem. 
A vida apenas, sem mistificação.

(ANDRADE, Carlos Drummond de. Reunião: 10 livros de poesia. 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1979) 

No poema “Os ombros suportam o mundo”, extraído de Sentimento do mundo, o eu lírico de Carlos Drummond de Andrade caracteriza-se pela
A
perspectiva metafísica em relação à realidade, evidenciada pela menção a Deus no primeiro verso.  
B
idealização do amor, uma vez que nunca atingiu a plenitude em suas relações amorosas. 
C
inaptidão em relação ao mundo, explicitada pela aversão aos que ainda não se libertaram. 
D
resignação em face do tempo presente, cuja chegada exige aceitar a vida tal como ela se apresenta.