Questão
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
2015
2ª Fase
ombros-suportam212649fe530
Discursiva
Os ombros suportam o mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu 
Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor. 
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho. 
E o coração está seco.

Em vão as mulheres batem à porta, não abrirás. 
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes. 
És todo certeza, já não sabes sofrer.

E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice? 
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança. 
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos 
edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo, 
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer. 
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem. 
A vida apenas, sem mistificação.

(Carlos Drummond de Andrade, Sentimento do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p.51.)

a) Na primeira estrofe, o eu lírico afirma categoricamente que “o coração está seco”. Que imagem, nessa primeira estrofe, explica o fato de o coração estar seco? Justifique sua resposta.

b) O último verso (“A vida apenas, sem mistificação”) fornece para o leitor o sentido fundamental do poema. Levando-se em conta o conjunto do poema, que sentido é sugerido pela palavra “mistificação”?