O país de Cocanha é uma fábula amplamente divulgada no Ocidente no final da Idade Média e na Renascença com uma presença talvez mais marcada na Itália do Norte e na região germano-flamenga. No país da Cocanha reinam a paz e a liberdade, a abundância e a diversidade alimentar, a eterna juventude e a festa, condições para uma felicidade estritamente terrestre. Todos levam vida de senhor, e os produtos alimentícios retratados são aqueles das refeições festivas, da superabundância de carnes às sobremesas bem gordurosas, das fontes de vinho instaladas nas praças públicas ao pão branco consumido fresco. O guloso come à sociedade o que quiser, quando quiser e onde quiser, verificando-se uma inversão do paraíso terrestre, que rejeita os sete pecados capitais e exalta uma felicidade terrestre que não pode ser mais materialista. A duração plurissecular do sucesso popular dessa fábula é sobretudo a expressão das frustrações e das inquietudes de uma sociedade que não aniquilou os riscos da miséria.
FLORENT, Quellier. Gula: história de um pecado capital. São Paulo: Ed. Senac São Paulo, 2011. Adaptado.
De acordo com o texto, a sobrevivência do mito de Cocanha no imaginário europeu se explica