Questão
Sprint ENEM
2021
Fase Única
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A primeira vez que vim ao Rio de Janeiro foi em 1855.

Poucos dias depois da minha chegada, um amigo e companheiro de infância, o Dr. Sá, levou-me à festa da Glória; uma das poucas festas populares da corte. Conforme o costume, a grande romaria desfilando pela Rua da Lapa e ao longo do cais, serpejava nas faldas do outeiro e apinhava-se em torno da poética ermida, cujo âmbito regurgitava com a multidão do povo.

Era ave-maria quando chegamos ao adro; perdida a esperança de romper a mole de gente que murava cada uma das portas da igreja, nos resignamos a gozar da fresca viração que vinha do mar, contemplando o delicioso panorama da baia e admirando ou criticando as devotas que também tinham chegado tarde e pareciam satisfeitas com a exibição de seus adornos.

Enquanto Sá era disputado pelos numerosos amigos e conhecidos, gozava eu da minha tranquila e independente obscuridade, sentado comodamente sobre a pequena muralha e resolvido a estabelecer ali o meu observatório. Para um provinciano recémchegado à corte, que melhor festa do que ver passar-lhe pelos olhos, à doce luz da tarde, uma parte da população desta grande cidade, com os seus vários matizes e infinitas gradações?

Todas as raças, desde o caucasiano sem mescla até o africano puro; todas as posições, desde as ilustrações da política, da fortuna ou do talento, até o proletário humilde e desconhecido; todas as profissões, desde o banqueiro até o mendigo; finalmente, todos os tipos grotescos da sociedade brasileira, desde a arrogante nulidade até a vil lisonja, desfilaram em face de mim, roçando a seda e a casimira pela baeta ou pelo algodão, misturando os perfumes delicados às impuras exalações, o fumo aromático do havana as acres baforadas do cigarro de palha.

— É uma festa filosófica essa festa da Glória! Aprendi mais naquela meia hora de observação do que nos cinco anos que acabava de esperdiçar em Olinda com uma prodigalidade verdadeiramente brasileira.

(Disponível em: https://www.literaturabrasileira.ufsc.br/documentos/?action=download&id=116831 Acesso em 29 de agosto de 2021)

Escrito à época do Romantismo, o trecho acima do romance Lucíola, de José Alencar, ilustra uma característica importante da prosa urbana romântica que é:
A
a delineação da incipiente cultura da cidade, ilustrada pelo crescimento da burguesia.
B
a exaltação da pátria como um lugar repleto de belezas naturais.
C
a idealização da figura amada e de sua condição de vassalagem amorosa.
D
o desinteresse pelas manifestações culturais que exploravam a diversidade do centro urbano.
E
a perspectiva de afastamento do narrador desse ambiente, criticando o comportamento dos que estão à sua volta.