A questão focaliza a comédia O juiz de paz da roça do escritor Martins Pena (1815-1848).
JUIZ: Sr. Escrivão, faça o favor de ler.
ESCRIVÃO (lendo): Diz Inácio José, natural desta freguesia e casado com Josefa Joaquina, sua mulher na face da Igreja, que precisa que Vossa Senhoria mande a Gregório degradado¹ para fora da terra, pois teve o atrevimento de dar uma embigada² em sua mulher, na
encruzilhada do Pau-Grande, que quase a fez abortar, da qual embigada fez cair a dita sua mulher de pernas para o ar. Portanto pede a Vossa Senhoria mande o dito Gregório degradado para Angola. E.R.M.³
JUIZ: É verdade, Sr. Gregório, que o senhor deu uma embigada na senhora?
GREGÓRIO: É mentira, Sr. Juiz de paz, eu não dou embigadas em bruxas.
JOSEFA JOAQUINA: Bruxa é a marafona⁴ de tua mulher, malcriado! Já não se lembra que me deu uma embigada, e que me deixou uma marca roxa na barriga? Se o senhor quer ver, posso mostrar.
JUIZ: Nada, nada, não é preciso; eu o creio.
JOSEFA JOAQUINA: Sr. Juiz, não é a primeira embigada que este homem me dá; eu é que não tenho querido contar a meu marido.
JUIZ: Está bom, senhora, sossegue. Sr. Inácio José, deixe-se destas asneiras, dar embigadas não é crime classificado no Código. Sr. Gregório, faça o favor de não dar mais embigadas na senhora; quando não, arrumo-lhe com as leis às costas e meto-o na cadeia.
Queiram-se retirar.
INÁCIO JOSÉ (para Gregório): Lá fora me pagarás.
JUIZ: Estão conciliados.
(Comédias (1833-1844), 2007.)
¹ degradado: degredado, banido, exilado.
² embigada: umbigada; pancada de umbigo contra umbigo, ou na região do umbigo.
³ E.R.M.: “Espera receber mercê”.
⁴ marafona: boneca sem rosto, constituída de uma cruz de madeira recoberta de pano.
Muito do efeito cômico desta passagem deve-se