Questão
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP
2019
Fase Única
VER HISTÓRICO DE RESPOSTAS
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A seguir, leia o fragmento de "A máquina do mundo", poema de Claro enigma, de Carlos Drummond de Andrade.

(...)

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada¹
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos²,

convidando-os a todos, em coorte³,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo (...).

(ANDRADE, Carlos Drummond de. Claro enigma. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 1991, p. 121-122.) 

Vocabulário:
¹ debuxada: rascunhada.
² périplos: longas viagens.
³ coorte: tropa.

Em 1951, a publicação de Claro enigma surpreendeu os leitores de Carlos Drummond de Andrade com uma série de novidades em relação à poética desenvolvida pelo autor nas décadas anteriores. Dentre essas novidades, do ponto de vista formal, o fragmento extraído de “A máquina do mundo” manifesta a 
A
recuperação da poética clássica, por meio do emprego de versos decassílabos e hipérbatos (inversões sintáticas). 
B
antecipação de experimentos pós-modernos, mediante o emprego de recursos gráfico-espaciais.  
C
influência do Arcadismo, por intermédio da construção de rimas ricas e alternadas.  
D
transgressão da estética modernista, mediante a adoção de versos livres e brancos.