Questão
Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP
2017
Fase Única
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O termo “mulato” nasceu racista, mas sem ele é difícil entender o Brasil

A palavra “mulato(a)” está na berlinda. Rebola no centro da polêmica às vésperas daquele que promete ficar na história como o Carnaval PC (“politicamente correto”, e não “Partido Comunista” ou “computador pessoal”).

No pente fino que alguns ativistas passam em marchinhas consagradas, à cata de vestígios de preconceito, a palavra tem sido tratada como piolho. Anda com fama de racista. Será?

Começo por varrer da avenida e jogar no lixo o argumento autoritário de que, não sendo mulato (há controvérsia), devo ficar calado no meu canto. É inaceitável. [...] Filha de uma época escravocrata (século 16), é inegável que a palavra “mulato” nasceu racista. Seu parentesco com “mula” é um fato. O elo entre o animal e a pessoa mestiça de branco e negro se deu pela ideia de hibridismo. O latim mulus já designava o produto – estéril – do “cruzamento do cavalo com a jumenta, ou da égua com o jumento” (Houaiss). [...] Entre essa constatação etimológica e a revolta de setores do movimento negro contra “mulato”, há uma distância. [...] Em mais de quatro séculos, o vocábulo “mulato” se encharcou tanto de história que hoje seria impossível descartá-lo sem uma grave perda cultural. [...] O Brasil é racista, mas de um racismo meândrico, muito diferente do americano, no qual negro é negro, branco é branco e a mulata não é a tal. E vem de lá o modelo – ululantemente racista – segundo o qual basta ter “uma gota” de sangue negro para ser negro. Não mulato, não mestiço, nada de nuance. Negro.

A importação desse trator conceitual é avanço? Retrocesso? Meio a meio? Ninguém disse que seria simples. De todo modo, acho recomendável ir devagar nessa hora, nem que seja em respeito ao sábio mandamento carnavalesco de João Bosco e Aldir Blanc: “Não põe corda no meu bloco!”

Baixando o volume da gritaria, talvez a gente consiga distinguir na cantoria vinda do bloco que desfila na rua ao lado o potencial libertário dos versos mulatos de Martinho da Vila: “José do Patrocínio/ Aleijadinho/ Machado de Assis que também era mulatinho/ Salve a mulatada brasileira!”.

Sérgio Rodrigues
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/sergio-rodrigues/2017/02/1857083-o-termo-mulato-nasceu-racistamas-sem-ele-e-dificil-entender-o-brasil.shtml>. Acesso em: mar. 2017. Adaptado.

As aspas duplas são empregadas várias vezes ao longo do texto. Podemos dizer que sua função, nesse caso, é
A
destacar ironia.
B
apresentar perspectiva satírica.
C
reproduzir fala do autor do texto.
D
reforçar sentido de expressão sarcástica.
E
destacar palavras e citações.