Trabalho escravo contemporâneo e como o tema pode cair no vestibular

Trabalho escravo contemporâneo e como o tema pode cair no vestibular

o trabalho escravo contemporâneo é uma das marcas deixadas pelo período de escravidão no Brasil. Veja dados e como pode cair na sua prova

Se engana quem pensa que não existem brasileiros em situação de escravidão no país em 2022. Um levantamento divulgado pelo Ministério do Trabalho e Previdência mostra que o Brasil encontrou 1.937 pessoas sob essas condições no ano de 2021, maior número desde 2013.

O estado com maior número de operações e resgates é Minas Gerais, que desde 2013 é o primeiro lugar desse ranking. Goiás, São Paulo, Pará e Mato Grosso do Sul fecham os cinco primeiros estados na lista.

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Ainda que a escravidão tenha sido abolida em 1888, pela Lei Áurea, somente na década de 40 o Código Penal Brasileiro passou a punir esse crime, que atualmente pode ser chamado de escravidão contemporânea, condições análogas à escravidão e trabalho escravo contemporâneo.

A escravidão no mundo

Segundo levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o mundo tem mais de 40 milhões de pessoas em situação de escravidão moderna no ano de 2016. No mesmo ano, a OIT também estimou que 152 milhões de crianças entre 5 e 17 anos foram submetidos ao trabalho infantil. Além disso, estima-se que o trabalho escravo gera mais de 150 bilhões de dólares.

A pesquisa afirma ainda que “se considerarmos os resultados dos últimos cinco anos, para os quais coletamos dados, 89 milhões de pessoas tiveram alguma experiência de escravidão moderna”. Se considerarmos que a pandemia de Covid-19 ainda não está nesses dados, a expectativa é que a situação possa ter piorado.

O que diz o Código Penal Brasileiro

O Código Penal Brasileiro prevê o trabalho escravo moderno pelo Artigo 149: “reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.”

A legislação também prevê aumento de pena para quem escraviza pessoas caso haja comprovação desse crime contra idosos, pessoas com deficiência, crianças e adolescentes, se uma das motivações envolver preconceito de cor, raça, etnia, religião ou origem, ou se houver constatação de tráfico de pessoas.

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Ciclo do trabalho escravo contemporâneo

O trabalho em condições análogas à escravidão pode conter vários traços diferentes: domésticas que nasceram em lares escravagistas, fazendas de culturas como café, cana, alho, soja e outros, mineração e produção de carvão vegetal, preparação de terreno… mas o ciclo costuma ter similaridades. Veja abaixo quais são.

Vulnerabilidade socioeconômica

Pessoas que são submetidas ao trabalho escravo contemporâneo geralmente cresceram em contexto de baixa renda per capita, com pouca ou nenhuma escolaridade, que estão desempregadas e que procuram saída para as condições precárias em que vivem. 

Muitos pensam que o trabalho em condições análogas à escravidão acontece apenas em fazendas e em garimpos, o que não é verdade. A localidade varia muito, podendo ser ambiente rural, cidades pequenas e grandes centros urbanos.

O professor de História do Estratégia Vestibulares, Marco Túlio, explica as ligações entre o aspecto social e econômico. “O combate ao trabalho escravo passa diretamente pelo combate à miséria e à vulnerabilidade social. É muito importante destacar que esses trabalhos ferem a dignidade humana, como o direito de ir e vir.”

Aliciamento e migração

O aliciamento é feito por pessoas chamadas de “gatos”, responsáveis por identificar e propor boa remuneração e trabalho, convencendo pessoas vulneráveis a aceitar tal oferta. A partir disso, eles são levados a locais distantes e até mesmo outros países, onde são submetidos a condição de escravização. Dívidas começam a ser adquiridas, tornando impossível o pagamento e iniciando o processo.

Vale ressaltar que o processo é o mesmo no caso de crianças e de pessoas que serão exploradas sexualmente. Na maioria das vezes, escravos sexuais, geralmente mulheres, sequer sabem que estão sendo levadas para se prostituir em seus destinos finais.

Trabalho escravo moderno

As vítimas chegam em seus destinos e se deparam com condições degradantes de alimentação, alojamento e trabalho, que são as reais condições, distantes do que foi prometido. Dívidas começam a ser adquiridas a partir de custos como alimentação e alojamento e ferramentas de trabalho. 

Outro fato recorrente é a retenção dos documentos dos escravizados, para que eles não exerçam sua cidadania e sejam forçados a quitar suas dívidas. A baixa remuneração, quando existente, faz com que a dívida só aumente.

Tentativa de fuga

Em muitos casos, há tentativas de fugas, o que envolve uma série de riscos, já que geralmente há uma rede de criminosos responsáveis por manter os escravizados controlados e sob ameaças constantes.

Após colocarem suas vidas em risco e conseguirem êxito, essas pessoas geralmente buscam ajuda, fazendo denúncias a órgãos competentes, responsáveis por investigar o caso.

Fiscalização e libertação

A denúncia é recebida por órgãos públicos como polícias, Ministério Público, Ministério do Trabalho ou alguma outra autoridade estatal, que deve fazer seu trabalho de fiscalização e averiguar o que foi descrito pela vítima, constatando o crime.

A fiscalização é fundamental para que o caso seja descoberto e atitudes legais sejam tomadas, como prisão e responsabilização dos criminosos, libertação de outros possíveis escravizados e aplicação de multas e outras penalizações previstas por lei.

Pagamento de direitos e demais penalizações

Criminosos responsáveis pelo crime podem sofrer penas diversas, que incluem reclusão e pagamento de indenizações pela situação gerada às vítimas, que pode gerar traumas para toda a vida. 

Além das punições legais, há também as trabalhistas: pagamento de direitos trabalhistas retroativos, como salário compatível com a jornada e demais direitos como férias remuneradas, fundo de garantia por tempo de serviço (FGTS) e décimo terceiro salário.

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Como se combate o trabalho escravo moderno

O principal ponto para se evitar situações de trabalho escravo moderno é a educação. Levar a informação às pessoas ajuda que elas identifiquem um possível crime com mais facilidade, podendo agir e recusar ou até mesmo denunciar sempre que uma situação parecida aconteça.

O acesso a terra e renda também faz com que o trabalho escravo diminua. Muitas pessoas expostas a tal situação estão em extrema vulnerabilidade, podendo inclusive estar passando por fome e miséria.

A assistência às vítimas também é fundamental, já que apenas a libertação não soluciona o problema a longo prazo. O pagamento de indenizações e o oferecimento de qualificações profissionais para as vítimas deve fazer parte do final desse ciclo, para que isso não se repita.

Por fim, é necessário reprimir, condenar e criminalizar os culpados, para que eles não voltem a cometer tal crime e nem mesmo inspirem novos infratores a buscar essa prática. 

Tipos de trabalho escravo

Identificar trabalho escravo nem sempre é fácil, já que algumas características podem se enquadrar em um emprego exploratório, mas não necessariamente escravagista. Veja alguns pontos que diferenciam os cenários.

Jornada exaustiva

Trabalhadores submetidos a longas jornadas de trabalho, em muitos casos não remunerados e que não permitam um descanso necessário entre elas — o período previsto na lei trabalhista brasileira é de 11 horas — indica condições de escravidão. O desrespeito em relação ao descanso semanal também é um forte indício.

Condições degradantes

Alojamentos precários, violência física e psicológica, insalubridade ou insuficiência de alimentação básica e água e falta de assistência médica são condições que indicam uma possível situação de escravidão.

Servidão por meio de dívidas

Se um trabalhador é forçado a prosseguir suas jornadas de trabalho por conta de dívidas com seu patrão, provavelmente ele está sendo submetido a um trabalho análogo à escravidão. Essas dívidas, como já pontuado no texto, podem se referir à alimentação, alojamentos, ferramentas e outros itens, e são criadas para manter o status de servidão dos escravizados.

Trabalho forçado

Se um trabalhador é forçado a continuar trabalhando, seja mediante a ameaças, dívidas, chantagens ou favores, ele está sendo submetido a um trabalho escravo. Todo trabalhador tem direito a abdicar de uma atividade trabalhista quando quiser.

Impunidade no julgamento dos casos

Para que o ciclo de trabalho escravo diminua, é preciso fazer com que a lei seja cumprida, o que não vem acontecendo. Um estudo da Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas (CTETP), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apontou que entre 2008 e 2019 houve 2.679 pessoas denunciadas por trabalho escravo, mas apenas 112 (4,2%) desses foram condenados em última instância.

Lista suja: o que é e como funciona

A lista suja foi criada em 2004 para reunir empregadores que submeteram trabalhadores à condições análogas à escravidão. Quem entra para a lista perde o acesso a créditos e financiamentos por dois anos e é monitorado por grupos de fiscalização móvel. Caso seja constatada uma reincidência, o nome se mantém no documento por mais dois anos.

A lista deixou de ser divulgada em alguns anos, após pedido da Advocacia-Geral da União (AGU), que foi atendido pelo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), o ministro Ives Gandra Martins Filho. Em 2020, em nova tentativa de barrar a divulgação da lista, o Supremo Tribunal de Justiça (STF), julgou constitucional o ato de divulgá-la, com base na Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011).

Veja três obras brasileiras que abordam a escravidão moderna

O tema pode ser visto em diversas obras brasileiras e também ao redor do mundo. Destacamos três que podem ser usadas como repertório sociocultural nas redações ou até mesmo como perguntas dos vestibulares do país.

Precisão: documentário sobre trabalho escravo

Lançado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela OIT, o documentário Precisão mostra flagrantes de trabalhadores resgatados em condições análogas ao trabalho escravo no Brasil. 

Na obra, os trabalhadores contam suas histórias, com o objetivo de alertar para práticas comuns que podem levar ao trabalho escravo, além de promover os princípios e direitos fundamentais do trabalho.

Quarto de Despejo

O livro de Carolina Maria de Jesus também pode nortear a discussão sobre a escravidão moderna, ainda que o livro se passe nos anos 50. Ao redor das discussões do livro é possível notar a fome como uma situação comum do local em que a autora vive e relata. Celina Gil, professora de Redação e Artes do Estratégia comenta sobre a analogia da escravidão com a obra.

“Em um momento do livro ela [a autora] fala sobre o Dia da Abolição da Escravatura na época, e que havia uma festa que se falava sobre a libertação do povo negro. Mas a autora complementa: ‘mas não ganhou, porque a escravidão moderna é a fome’. Ali ela identifica no livro o quanto ela olha em volta e só tem pessoas negras. É muito tentador a gente achar que num país como o Brasil é possível separar as coisas”.   

Marco Túlio complementa sobre o tema: “Embora a escravidão tenha sido abolida em 1888, são praticamente 400 anos de escravidão que marcam a nossa história. É um elemento fundamental da nossa identidade. Algo que foi construído em séculos não vai ser apagado de uma hora para outra.”

Torto Arado

A história escrita por Itamar Vieira Junior conta a história de duas irmãs que vivem em um contexto de violência e vulnerabilidade no campo, em meio a um cenário atravessado por problemas estruturais que ainda torturam o país.

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Celina explica um ponto que o autor buscou trazer no livro. “Tem muito haver com a relação de ausência do Estado: onde o Estado não chega, a justiça também não chega”. O livro foi lançado em 2019 e venceu o Prêmio Jabuti de Romance Literário do mesmo ano.

“É difícil a gente olhar para o livro e entender que o que está acontecendo é agora, o Torto Arado não está falando de 200, 100 anos atrás”, pontua Celina sobre a dificuldade que pessoas que moram em grandes cidades podem ter na compreensão da contemporaneidade da obra.

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