Estratégia resume: O Cortiço, de Aluísio Azevedo

Estratégia resume: O Cortiço, de Aluísio Azevedo

Confira o resumo da obra que marcou o Naturalismo no Brasil, baseado na aula do professor Fernando Andrade

Considerado um marco no texto em prosa do movimento naturalista brasileiro, O Cortiço é um romance publicado em 1890 pelo escritor maranhense Aluísio Azevedo. 

O livro faz jus ao movimento que se insere e retrata com clareza as ideias científicas de Aluísio Azevedo. Em seus 23 capítulos, a obra nos leva ao cotidiano de uma moradia coletiva no Rio de Janeiro do século XIX e nos permite conhecer as ambições de seu proprietário e protagonista do livro, João Romão.

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A relevância de O Cortiço para literatura brasileira se perpetua mesmo após mais de 130 anos de sua primeiro publicação. Por isso, vestibulares de instituições públicas, como a Universidade Federal de Uberlândia (UFU), e privadas, como a Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp), cobram a leitura de seus candidatos.

Pensando em te ajudar a compreender a obra, o Estratégia Vestibulares preparou um resumo com tudo o que você precisa saber: contexto histórico, personagens, biografia do autor, linguagem, gênero textual e questões fundamentais do livro. Confira:

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Quem foi Aluísio Azevedo?

Nascido em 14 de abril de 1857, na cidade de São Luís, no Maranhão, Aluísio Azevedo era filho do vice-cônsul português David Gonçalves de Azevedo e de Emília Amália Pinto de Magalhães. Seu irmão mais velho, Artur Azevedo, era um crítico do Romantismo — escola literária que durou de 1836 a 1881 no Brasil — e escrevia textos cômicos. 

Enquanto crescia, Aluísio trabalhou como caixeiro e guarda-livros, enquanto desenvolvia interesse por desenho e pintura. Em 1876, foi morar com seu irmão no Rio de Janeiro, onde começou a estudar na Imperial Academia de Belas Artes — atual Escola Nacional de Belas Artes. Para sobreviver financeiramente na então capital do Brasil, o autor trabalhava como caricaturista para jornais como O Fígaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A Semana Ilustrada.

Após a morte de seu pai, em 1878, Aluísio voltou a São Luís para assumir o papel de chefe da família, mesmo período em que começou sua carreira como escritor. Apesar de também ser um crítico do Romantismo, o autor publicou obras que acompanhavam essa escola literária a fim de conquistar o público, para então escrever sobre o que realmente se interessava.

Em 1879, Aluísio Azevedo publicou Uma Lágrima de Mulher, no mesmo ano em que ajudou a lançar o jornal anticlerical O Pensador, que contrário à Igreja, defendia a abolição da escravatura. Seu primeiro livro Realista/Naturalista foi O Mulato, publicado em 1881, que chocou a sociedade brasileira ao tratar do racismo.

Ainda em 1881, Aluísio voltou a morar no Rio de Janeiro e passou a escrever para os folhetins de jornais, O Cortiço foi publicado desta forma. Em 1895, o autor abandonou a atividade literária e começou a atuar como diplomata, trabalhando na Espanha, Japão, Inglaterra, Itália e Argentina, onde faleceu em 1913.

Contexto histórico de O Cortiço

Após a Guerra do Paraguai, em 1870, a monarquia brasileira estava em decadência e ideias republicanas impulsionadas pelo Movimento Positivista, da Europa, começaram a circular mais fortemente pelo País. 

O modelo de sociedade industrial que havia no Velho Continente desde o século XVIII começa a evidenciar, aos intelectuais brasileiros, o atraso econômico e social em que o País vivia: um sistema econômico de base agrícola e o regime escravocrata de trabalho. É nesse contexto em que o Naturalismo, movimento literário de O Cortiço, surge.

Século XIX no mundo

A segunda metade do século XIX foi marcada pela Segunda Revolução Industrial. Países europeus, os Estados Unidos e o Japão passavam por inovações nas indústrias do aço, petróleo, química  e eletricidade.

As mudanças nas relações de trabalho, com a migração da mão de obra do campo para as cidades, estavam consolidadas, e este é o período em que os operários começavam a reivindicar melhores condições de trabalho.

Século XIX no Brasil

No Brasil, o final do século XIX é marcado pela abolição do regime de trabalho escravo e da proclamação da República. O partido republicano nasce em 1873, enquanto os liberais acolhem as novas ideias de organização da sociedade, vindas do exterior, os monarquistas resistem junto à Família Real.

O embate de ideias é visível na carreira de autor de Aluísio de Azevedo, que precisava produzir obras românticas, que agradavam o público mais tradicional e lhe traziam renda, e produzia pouco de Naturalismo, voltado aos entusiastas das novas ideias cientificistas.

Século XIX na cidade do Rio de Janeiro

Neste período, a cidade do Rio de Janeiro era a capital do Brasil, e depois da abolição da escravidão um quadro de excedente populacional recaiu sobre o município. Pessoas que eram escravizadas no interior do estado e em outras partes do país foram procurar oportunidades de trabalho livre no Rio, além do contingente de estrangeiros trazidos pela política de imigração.

O boom populacional que o Rio de Janeiro enfrentou entre o final do século XIX e o início do século XX, aliado à falta de planejamento urbano e saneamento básico, foi o responsável por epidemias de doenças como febre amarela e peste bubônica, que levaram várias pessoas a óbito.

O Cortiço, de Aluísio de Azevedo, retrata bem o período em que a população crescia, junto à falta de emprego formal e as moradias coletivas, que reuniam os mais pobres.

Linha do tempo da obra

Apesar de não demarcar em que momento exato a história se desenvolve, Aluísio Azevedo dá ideia que o livro se passa após a Guerra do Paraguai (1870)  e a promulgação da Lei do Ventre Livre (1871), quando trata do personagem Botelho, amigo de Miranda.

Além disso, a entrega do diploma de sócio benemérito de uma comissão abolicionista a João Romão, evidencia que a história acontece entre 1880, quando os movimentos abolicionistas estavam em atividade, e 1888, quando é assinada a Lei Áurea.

Movimento em que o livro se encaixa

A obra se encaixa no movimento literário do Naturalismo, e quando falamos sobre ele, é preciso entender as ideias que circulavam na época e influenciavam as produções culturais desse movimento: o cientificismo, o positivismo e o determinismo.

  • Cientificismo: não deixou marcas precisas no livro e trata-se de uma valorização da ciência como o novo modo de descrever o mundo.
  • Positivismo: filosofia do progresso humano baseado no conhecimento;
  • Determinismo: entende a natureza como uma máquina e surge para explicar a sociedade através dessa ideia.

Os estudos de Charles Darwin serviram para corroborar esse tipo de pensamento. Afinal, segundo o Determinismo, se existe lei do mais apto na natureza, existe lei do mais forte na sociedade humana (Darwinismo Social). E se há variação entre espécies e essa variação determina o mais forte, paralelamente há variação no mundo humano, expressa pela teoria das raças.

Tendo suas vidas regidas pelo Determinismo, as personagens do Movimento Naturalista podiam ser observadas, segundo o crítico literário e sociólogo da época, Sílvio Romero, por uma ótica “biossociológica”, percebida em 3 dimensões:

  • Dimensão da Natureza: em O cortiço, há descrições da natureza, do solo encharcado, da dureza da pedreira, o abrasar do sol. O autor faz com que esses elementos, assim como o próprio cortiço, atuem como causas para o comportamento das pessoas;
  • Dimensão étnica e biológica: usando a analogia de espécie, dos animais, como raça para os seres humanos, alguns pensadores desenvolveram a ideia de raças mais e menos adaptadas. Nessa perspectiva, os europeus entendem que sua “raça” é superior a outras pelo desenvolvimento da escrita e da tecnologia, por exemplo. Os mais prejudicados nessa linha ideológica são os povos indígenas e negros;
  • Dimensão moral: Os elementos anteriores se mesclam para produzir formas de viver e de justificar os desejos e os atos animalescos, condenados socialmente, mas praticados às escondidas. É possível observar essa dimensão na diferença da moral do cortiço e do sobrado e nas formas de viver a sexualidade entre a classe mais baixa e a classe mais alta.

Realismo x Naturalismo

Apesar de próximos, os dois têm suas diferenças. Enquanto o Realismo surge primeiro e é um movimento literário marcado por contar histórias normais e cotidianas de forma realista, o Naturalismo, que surgiu do Realismo, também faz isso, mas influenciado por teorias científicas. 

Personagens de O Cortiço

  • João Romão: começa a vida pobre, passa a ser um vendeiro que, com muito esforço e alguns furtos construiu umas casinhas. Elas se multiplicam. O protagonista inveja seu rival Miranda e, por conta disso, deseja também status. No final, ele sacrifica Bertoleza, sua companheira, e passa a circular pela sociedade carioca como grande capitalista;
  • Miranda: comerciante português que compra o sobrado ao lado d’O Cortiço. É infeliz em seu casamento com Estela, da qual já sofreu traições, mas não se divorcia pois precisa da riqueza da esposa para manter sua boa posição social. Torna-se rival do protagonista;
  • Jerônimo: português trabalhador, responsável e bom pai de família. É seduzido por Rita Baiana e “abrasileira-se”. Abandona a esposa e a filha e vai morar com Rita Baiana. Torna-se irresponsável, preguiçoso e dado a festas.
  • Bertoleza: escrava que pensa ter sido alforriada. Após a morte de seu companheiro, inicia uma relação amorosa com João Romão, trabalha para ele e o ajuda em seus furtos;
  • Estela: esposa infiel de Miranda;
  • Zulmira: filha de Estela e de Miranda, casa-se com João Romão e promove a ascensão social do dono do cortiço graças ao casamento.
  • Rita Baiana: performa o estereótipo da mulher brasileira ao ser descrita como atraente e sensual. Por ser negra, busca se relacionar amorosamente com homens brancos, os quais são enxergados como pertencentes a uma raça superior;
  • Piedade: esposa abandonada por Jerônimo que se torna alcoólatra;
  • Firmo: namorado de Rita Baiana que acabou assassinado;
  • Pombinha: moça inocente, pura e bondosa com todos. Casa-se, trai o marido e torna-se prostituta.

Como o gênero romance é visto em O Cortiço

O Cortiço é uma obra literária do gênero romance, uma forma de narrativa em prosa que surge com Dom Quixote, novela de cavalaria escrita por Miguel de Cervantes no século XIV. Durante a escola literária do Romantismo, no século XVIII, o romance e o folhetim — histórias ficcionais publicadas periodicamente nos jornais da época — eram considerados sinônimos. 

Veja as principais características do gênero literário romance:

  • Enredo: pode-se considerar que há vários núcleos de enredo que podem ser observados: o do próprio cortiço; o de João Romão; o de Jerônimo e o de Pombinha. Todos eles unidos pela história do vendeiro. É importante lembrar que enredo significa uma história na qual se observa algum tipo de transformação;
  • Tempo: o narrador adota o tempo cronológico. Ele conta a história respeitando a sequência dos eventos. Às vezes, ele usa a técnica de flash back, como por exemplo, ao falar da sedução sofrida por Pombinha;
  • Espaço: o fato de o livro ter como título “O Cortiço” já indica a importância do espaço. Para os naturalistas, o ambiente determina os indivíduos. A ideia é clara: o ambiente de deterioração moral do cortiço destrói qualquer tipo de pretensão que possa transcender as necessidades fisiológicas, inclusos os impulsos sexuais;
  • Narrador: o narrador é em terceira pessoa, objetivo, com pequenas inserções intrusivas e parcialmente onisciente; e
  • Personagens: bem definidas. 

Crítica e análise de O Cortiço

A essa altura, é importante evidenciarmos que O Cortiço é uma obra inspirada no livro francês A Taberna, publicado em 1877 por Émile Zola, o criador do Naturalismo na Europa. A obra de Zola traz como protagonista uma lavadeira e trata de alcoolismo, prostituição e degradação da sociedade pobre de Paris.

A partir disso, podemos chegar às questões-chaves apresentadas por Aluísio Azevedo em seu livro: a luta de classes e o sentimento antilusitano.

Capitalismo primitivo e luta de classes

João Romão sempre teve a ambição de enriquecer e se tornou dono de uma mercearia após recebê-la como pagamento das dívidas que seu patrão, também português — que voltou a sua terra natal —, tinha com ele por seu tempo de trabalho. O homem é retratado como tão sovina a ponto de dormir sobre o balcão da venda para economizar dinheiro.

Mas o protagonista não para por aí, em seu caminho rumo a ascensão financeira, João rouba o dinheiro que sua amante Bertoleza economizava para comprar sua carta de alforria, e a engana com um documento de liberdade falso. Além de explorar o trabalho da mulher em sua mercearia e tomá-la como cúmplice em seus furtos de materiais para a construção do cortiço.

A guinada financeira de João Romão, que tem seu ápice quando ele se casa com Zulmira, filha de seu inimigo Miranda e herdeira do sobrado ao lado do cortiço, serve como alegoria ao conceito de “capitalismo primitivo” de Karl Marx. 

O filósofo alemão usou o termo para se referir ao momento em que a ascendente classe burguesa pilhou ou se apropriou da riqueza alheia para formar sistemas de financiamento e de circulação capazes de garantir uma economia baseada na circulação da mercadoria.

O autor deixa claro que o cotidiano do personagem era tirar vantagens financeiras em literalmente todas as situações possíveis. Em uma das passagens do livro, o pensamento capitalista de João Romão fica evidente ao se tratar de seu funcionário, o personagem também português Jerônimo: pagaria um salário alto, mas aquilo que sairia do caixa entraria de outra forma, pois o cavouqueiro moraria no cortiço e compraria seus mantimentos da venda.

No artigo De Cortiço a Cortiço, o crítico literário Antonio Candido (1918-2017) evidencia que no romance francês A Taberna, há um certo distanciamento entre explorador e explorado, o que impede que se veja o processo como criminoso. Em O Cortiço, João Romão vive no mesmo ambiente que os moradores miseráveis e a construção de seu sobrado ao lado da estalagem deixa muito claro de onde vem sua riqueza.

Antilusitanismo

Por mais sofrida que a vida dos personagens moradores do cortiço possa parecer para o leitor, o autor deixa claro que a espontaneidade que ali viceja parece ser muito mais agradável do que o formalismo social que impera na casa do Miranda.

As festas que agitam o cortiço são marcadas por diversão sem limites e solidariedade. Daí porque acontece muitas vezes o improvável, um certo olhar de inveja do sobrado para o cortiço.

Esse cenário, porém, muda junto com a classe social de João Romão. Após um incêndio no cortiço, o lugar é reconstruído de forma mais moderna, limpa e organizada, e sem a espontaneidade que era marca da estalagem.

Não haviam mais festas e nem os pagodes de Rita Baiana e moradores mais comportados tinham se mudado para a estalagem. Agora, as antigas características do cortiço de João Romão eram encontradas em seu concorrente, o Cabeça-de-Gato.

“À proporção que o São Romão se engrandecia, mais e mais ia-se rebaixando acanalhado, fazendo-se cada vez mais torpe, mais abjeto, mais cortiço, vivendo satisfeito do lixo e da salsugem que o outro rejeitava, como se todo o seu ideal fosse conservar inalterável, para sempre, o verdadeiro tipo da estalagem fluminense, a legitima, a legendária; aquela em que há um samba e um rolo por noite; aquela em que se matam homens sem a polícia descobrir os assassinos…”

Se por um lado, a teoria determinista justifica o português vencedor, a exposição do modo como isso é conseguido coloca-o na posição de grande vilão. Os brasileiros tornam-se vítimas do português, reforçando o senso comum da época de que, apesar da Independência, os brasileiros continuavam submetidos aos portugueses.

Reações à obra

Quando Antonio Candido faz uma comparação de O Cortiço com A Taverna, o crítico determina que a obra de Aluísio Azevedo é inferior à de Émile Zola pela limitação do contexto brasileiro ao capitalismo primitivo.

Enquanto o autor francês apresenta embates de classes sociais, o brasileiro traz uma alegoria fiel ao modo de exploração nacional — longe de um capitalismo industrializado — e retrata de forma fidedigna o modo de viver no Rio de Janeiro ao final do século XIX.

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