Fruto de intensa luta dos movimentos abolicionistas e da pressão política e econômica do Império Britânico, a Lei que colocou fim, oficialmente à escravidão no Brasil foi sancionada em 13 de maio de 1888. Porém, antes disso, os grandes senhores de escravos tentaram ao máximo postergar a abolição, inclusive por meio de seis leis sobre escravidão que foram sancionadas antes da Lei Áurea.
Além de ter sido o último País das Américas a acabar com esse regime de trabalho, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil foi o país que mais importou pessoas escravizadas. Entre os séculos XVI e meados do XIX, foram trazidos de forma forçada cerca de quatro milhões de homens, mulheres e crianças, o equivalente a mais de um terço de todo comércio negreiro mundial.
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Lei Feijó (1831)
Promulgada em 7 de novembro de 1831, a Lei Feijó foi a primeira medida relacionada a mudanças no regime de trabalho escravo em terras brasileiras. Ela determinava que, a partir da data de sua sanção, toda pessoa escravizada que chegasse ao Brasil estava automaticamente livre, exceto em duas situações: quando o escravizado trabalhava em embarcações de países onde a escravidão ainda era permitida e quando o escravizado fugisse de território ou embarcação estrangeira buscando a proteção da Lei Feijó no Brasil.
O nome da norma faz referência a Diogo Antônio Feijó (1784 – 1843), um sacerdote e político brasileiro, que apesar de ser dono de escravos em um engenho no atual território da cidade paulista de Campinas, colaborou para a aprovação da Lei de 7 de novembro de 1831.
E a origem dessa Lei não para por aí, foi graças a ela que a expressão “para inglês ver” surgiu, já que, com a Revolução Industrial, a Inglaterra usava de sua influência como maior potência econômica mundial para pressionar a abolição da escravidão no Brasil, além, é claro, dos movimentos abolicionistas locais.
Longe de ideais humanitários, a Inglaterra precisava do fim da escravidão e do trabalho livre e remunerado para criar mercados consumidores para o seu recém implementado capitalismo industrial. E para isso, condicionou o reconhecimento da independência brasileira à extinção da importação de pessoas escravizadas.
Por isso, a Lei Feijó foi sancionada “para inglês ver”, mas não foi posta em ação, fazendo com que no seu primeiro ano de vigência houvesse uma queda no tráfico de escravos, que voltou a acontecer sem empecilhos nos anos seguintes.
Você sabia?
A expressão “Para inglês ver” significa que algo foi feito apenas para causar efeito de aparência, sem validez real.
Lei Eusébio de Queirós (1850)
Como a Lei Feijó não se mostrou efetiva aos seus propósitos, foi criada pelo então Ministro da Justiça Eusébio de Queirós, a Lei nº 581, que foi promulgada em 4 de setembro de 1850. Assim como sua antecessora, a norma, que ficou conhecida com o nome de Eusébio de Queirós, tinha como objetivo extinguir o tráfico de escravos para o Brasil e fazer com que os escravizados trazidos para cá entre os anos de 1831 e 1845 continuassem sendo explorados legalmente.
O interesse em efetivar uma Lei que verdadeiramente colocasse fim à importação de pessoas escravizadas surgiu do Estado brasileiro ainda por pressão dos ingleses, que, após não verem compromisso com o cumprimento da Lei Feijó, criaram uma legislação própria, conhecida como “Bill Aberdeen”.
A Lei Bill Aberdeen permitia que navios da Marinha Inglesa aprisionassem embarcações que estivessem traficando escravos no Oceano Atlântico, além de dar aval para aprisionar navios negreiros em águas brasileiras, e levar suas tripulações para julgamento de pirataria em tribunais ingleses.
Lei Nabuco de Araújo (1854)
Estabelecida pelo Decreto nº 731, de 5 de junho de 1854, a Lei foi pensada para complementar a Eusébio de Queirós, e ainda tratava sobre tráfico negreiro. Com a extinção legal do tráfico para a importação de escravos, o comércio entre estados se fortaleceu, e pessoas escravizadas eram enviadas, principalmente, do nordeste para o sudeste.
Esse contingente de pessoas vendidas do nordeste para outros estados não era de, necessariamente, escravos que já estavam no Brasil, mas também daqueles que ainda eram trazidos ao País por meio de contrabando. A Lei Nabuco de Araújo visava aumentar a repressão a esse tipo de prática.
Dessa forma, o contrabando de escravizados só foi extinto em 1856, dois anos após a sanção da terceira Lei com essa finalidade.
Lei de Terras (1850)
Sancionada em 18 de setembro de 1850, a Lei nº 601, conhecida como Lei de Terras, não tratava diretamente sobre escravidão, mas é fundamental no caminho jurídico feito pelo Estado para garantir os direitos dos senhores de escravos após a abolição desse regime de trabalho, que parecia inevitável, e viria anos mais tarde com a Lei Áurea.
A Lei de Terras determinou que só era permitido adquirir propriedades por compra, venda ou doação estatal. Sendo assim, a propriedade por usucapião — quando o ocupante de uma área passa a ser legalmente dono dela devido ao tempo em que ali esteve — estava abolida.
A medida visava destinar a propriedade das terras apenas para os grandes senhores de terra, que lucravam com a escravidão, em detrimento dos negros e dos imigrantes que chegavam ao Brasil. Além disso, a Lei 601 possibilitou os latifúndios existentes até os dias de hoje, passados de pai para filho.
Lei do Ventre Livre (1871)
Inspirado por legislações do tipo, aprovadas em outros países da América Latina, o Visconde do Rio Branco criou a proposta de Lei do Ventre Livre, que foi aprovada como Lei nº 2.040, em 28 de setembro de 1871. A medida estabeleceu que os filhos de mulheres escravizadas estariam livres a partir de sua promulgação, mas não de forma tão simples.
A liberdade só poderia ser concedida à criança quando ela completasse oito anos de idade, e em até 30 dias após seu oitavo aniversário, o dono de sua mãe poderia escolher receber uma indenização do governo por libertar a criança ou escravizá-la até que completasse 21 anos. Havia também a possibilidade da própria criança ou um terceiro indenizar o senhor de escravos para que ela não tivesse que trabalhar até a maioridade.
Lei dos Sexagenários (1885)
A Lei nº 3.270, 28 de setembro de 1885, ficou conhecida por Lei dos Sexagenários e Lei Saraiva-Cotegipe. Ela entrou em vigor apenas três anos antes da abolição, e estabeleceu a libertação dos escravos com mais de 60 anos.
O primeiro esboço da Lei, elaborado pelo presidente do Conselho de Ministros — que equivale a um Primeiro Ministro — Manuel Pinto de Sousa Dantas, era bem diferente de como ela foi aprovada, prevendo as seguintes reformas no regime escravocrata de trabalho: abolição total da escravidão no Brasil em até 16 anos, libertação imediata de escravos com mais de 60 anos sem indenização aos donos, reorganização da tabela de preços de escravos, proibição do tráfico interprovincial, permissão da distribuição de pequenas terras para ex-escravos e anulação das matrículas irregulares de escravos.
Porém, quando entrou em vigor, a Lei nº 3270 já havia passado por alterações dos substitutos de Dantas, feitas por José Antônio Saraiva e João Maurício Wanderley, o Barão de Cotegipe, que eram muito mais conservadores e favoráveis ao regime escravocrata. Sendo assim, a Lei dos Sexagenários passou a vigorar com as seguintes previsões:
- Libertação escravos com mais de 60 anos;
- Os sexagenários escravizados deveriam trabalhar para os seus senhores por três anos antes de serem libertos, com os 65 anos sendo a idade limite;
- Sexagenários libertos deveriam continuar morando com seus senhores e só poderiam mudar-se com a autorização de um juiz de órfãos;
- Sexagenários libertos eram obrigados a morar na cidade onde foram alforriados por cinco anos (exceto para as capitais);
- Preços altos seriam estabelecidos para que os escravos fossem alforriados;
- Proibição do tráfico interprovincial de escravos.
Com ou sem as alterações, a Lei dos Sexagenários não tinha a pretensão de ser efetiva, mas sim de retardar a abolição definitiva que estava no horizonte. E isso se prova por dados sobre expectativa de vida de pessoas escravizadas na época, segundo o livro “Segredos Internos: engenhos e escravos na sociedade colonial (1550-1835)”, de Stuart B. Schwartz, professor de História da Universidade de Yale, a expectativa de vida dos escravos no Brasil variava em torno de 19 anos, no último quarto do século XIX.
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