Verso branco: o que é, exemplos e modernistas

Verso branco: o que é, exemplos e modernistas

Escrever poesia é um processo literário, em que a estrutura é pensada e produzida para cumprir um objetivo, a depender da escola literária e seus ideais políticos, sociais e artísticos. Nos textos escritos com verso branco existe a intenção de montar uma poesia em que não apareçam rimas, como contraponto ao que era proposto nas academias literárias mais clássicas. Continue lendo e conheça mais sobre o tema. 

Conceito de verso branco 

Segundo a classificação literária, os textos são divididos em dois grandes grupos: prosas e poesias. Enquanto os textos em prosa são escritos em parágrafos, frases e ideias completas, encadeadas de forma contínua, as poesias são construídas em estrofes e versos. 

Basicamente, um verso é uma linha da poesia e a estrofe é um conjunto desses versos. Alguns poemas possuem apenas uma estrofe, outros possuem duas ou mais, tudo isso depende da estrutura escolhida pelo autor.

Nas academias literárias clássicas, era necessário que esses versos fossem escritos com uma contagem fonética chamada escansão em que, basicamente, buscava-se manter o mesmo número de sílabas poéticas em todas as frases da poesia. Ao mesmo tempo, era importante ter um esquema de rimas, em que as últimas palavras dos versos deveriam ter uma sonoridade semelhante. 

Então, algumas escolas da literatura surgiram para romper com os padrões academicistas. Alguns autores sentiram a necessidade de escrever com mais liberdade estrutural, adicionar novas características e assinaturas de suas personalidades nas obras.

Nesse contexto surgem os versos brancos, que evitam a semelhança sonora entre as palavras, ou seja, não possuem rima. Apesar de fugir da musicalidade clássica das poesias, os poemas em verso branco possuem uma preocupação com a escansão, com a contagem de sílabas poéticas e metrificação do texto. 

Características do verso branco 

Também conhecidos como versos soltos, os versos brancos são metricamente estruturados, mas sem as clássicas rimas poéticas. Então, há uma grande preocupação estética, para construir um texto com medidas fixas, bem estabelecidas e pensadas. 

Por outro lado, a musicalidade é deixada de lado, em favor de outros aspectos artísticos, como a beleza visual. Isso demonstra a riqueza da arte, em ser evidenciada de diferentes formas, a depender da necessidade, vontade, personalidade e expressão daquele artista, sobre aquele tema em específico. 

É importante ressaltar que os versos brancos são característicos de obras modernas e contemporâneas. Afinal, essas épocas artísticas são marcadas pela inovação, ruptura com os padrões formais da arte, tanto na literatura, nas artes plásticas, na música, teatro e outras expressões artísticas. 

Lembre-se que o Modernismo, no Brasil, fortaleceu-se a partir da Semana de Arte Moderna de 1922, quando diversos artistas expuseram artes fora dos padrões da época e causaram um choque na população e críticos literários.

Essa foi a grande marca dos modernistas brasileiros, que utilizaram estruturas diferentes para trazer temas como a identidade da nação, folclores e aspectos da cultura brasileira, indagações psicanalíticas influenciadas por Freud entre outros tópicos que refletem a busca pela inovação dentro da arte. 

Para cumprir esse objetivo, nada melhor do que uma transformação dentro da obra escrita, por isso os versos brancos, os versos livres, uso de ironia, sarcasmo, temas pouco comuns, entre outros recursos que revolucionaram o fazer artístico. Essa estrofe do texto “Não se mate” de Carlos Drummond de Andrade exemplifica um texto sem rimas:

“Carlos, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje beija, amanhã não beija,
depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe
o que será.”

Diferença de verso branco e verso livre

Se os versos brancos são construídos em oposição às rimas, como foi comentado anteriormente, muitas vezes eles possuem metrificação e escansão. Então, como seriam classificados os versos que aceitam as rimas e a sonoridade, mas afastam a métrica?

Surgiram, assim, os versos livres. São poesias escritas sem métrica, contagem de sílabas poéticas ou uma estrutura fixa, mas apresentam a possibilidade de adicionar rimas e musicalidade.

Portanto, note a diferença de conceito entre as classificações e como elas podem aparecer simultaneamente: são textos com ausência de rimas e ausência de metrificação na mesma obra literária. 

Exemplo de verso branco

Versos brancos
Uma fina saudade vai varando
a quietude cansada do meu tédio.
Mas, saudade do quê? de quem?…
Os dias
são bolas de cristal, azuis, polidas,
lisas, sem uma aresta traiçoeira
em que venha prender-se e estraçalhar-se
o véu de um pensamento de outros tempos;
sem nem o esconderijo de uma nuvem
onde fique um olhar longo de outrora
olhando para as cinzas destes instantes;
nem uma sombra forte em que se oculte
um pedaço perdido de passado…
Tudo, em torno de mim, é luminoso,
alto e macio, deslizante e lindo;
tudo é apenas um lúcido presente:
é a negação perfeita da saudade…
E no entanto – por quê? por quem?… – eu vejo
e ouço passar na terra a minha vida
cantando uma cantiga vagarosa
de água que leva flores na descida…

Questão de vestibular 

Enem/2021

Descobrimento

Abancado à escrivaninha em São Paulo
Na minha casa da rua Lopes Chaves
De supetão senti um friúme por dentro.
Fiquei trêmulo, muito comovido
Com o livro palerma olhando pra mim.

Não vê que me lembrei lá no norte, meu Deus!
[Muito longe de mim,

Na escuridão ativa da noite que caiu,
Um homem pálido, magro de cabelo escorrendo
[nos olhos,
Depois de fazer uma pele com a borracha do dia,
Faz pouco se deitou, está dormindo.

Esse homem é brasileiro que nem eu…

ANDRADE, M. Poesias completas. Belo Horizonte: Villa Rica, 1993.

O poema modernista de Mário de Andrade revisita o tema do nacionalismo de forma irônica ao

referendar estereótipos étnicos e sociais ligados ao brasileiro nortista.

a) idealizar a vida bucólica do norte do país como alternativa de brasilidade.

b) problematizar a relação entre distância geográfica e construção da nacionalidade.

c) questionar a participação da cultura autóctone na formação da identidade nacional.

d) propalar uma inquietação desfavorável quanto à aceitação das diferenças socioculturais.

O eu lírico enfatiza expressões que são geográficas/locais: “lá no Norte” e “muito longe de mim”. Apesar da distância, conclui dizendo que “Esse homem é brasileiro que nem eu.” Sendo um poema de revisionismo histórico, isto é, que se propõe a olhar para o passado criticamente, o eu lírico problematiza a dificuldade de construção de uma identidade nacional em um país como o Brasil, com dimensões continentais. Nesse sentido, a perspectiva de inclusão é dificultada por distâncias geográficas.

Alternativa correta: C

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