Racismo: o que é, tipos de discriminação e cenário no Brasil

Racismo: o que é, tipos de discriminação e cenário no Brasil

Historicamente, diversos povos de etnias não brancas convivem com consequências de práticas racistas; entenda mais sobre o assunto

O racismo é um conjunto de práticas discriminatórias e de preconceito estabelecidas sobre uma ideia de supremacia branca. Esse ideário que sustentou e sustenta o racismo até os dias de hoje vem de um conceito de hierarquia de raças, que cria diferenças raciais inexistentes para explicar e desqualificar as diferenças naturais de cultura, etnia, religiões e línguas, por exemplo.

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Essas motivações supremacistas foram fundamentais para políticas imperialistas, de dominação e colonização desde a expansão marítima europeia, a partir do século XVI. E tais práticas seguem naturalizando a violência contra grupos não brancos até os dias de hoje, em diferentes partes do mundo.

Confira, a seguir, alguns dos tipos de discriminação racista e qual é o cenário atual do Brasil:

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Tipos de racismo

Entenda, a partir de breves explicações, os conceitos de algumas expressões do racismo:

Racismo estrutural

Como o nome sugere, o racismo estrutural se expressa na forma como uma sociedade ou grupo social constrói suas relações pessoais, profissionais e de poder. Ou seja, é uma prática intrínseca, que passa despercebida a muitas pessoas, o que faz com que ela seja naturalizada.

Esse tipo de racismo é muito presente em sociedades que foram construída na base do trabalho escravo de negros e indígenas, como é o caso do Brasil, e sobre mitos de superioridade branca. 

Estereótipos que colocam pessoas não brancas em posições de criminosos, por exemplo, são banalizados e não associados às verdadeiras causas históricas que os produziram, como o fim do regime escravocrata, que não garantiu assistência social às pessoas libertas e as deixou, junto com seus descendentes, sem direitos básicos e vivendo à margem do resto da sociedade.

Discriminações desse tipo não estão presentes apenas nas percepções pessoais dos indivíduos, elas também se expressam nas instituições do Estado, com o sistema carcerário sendo composto majoritariamente de pessoas não brancas, em empresas privadas, com exclusão de pessoas estereotipadas pelo racismo, e na mídia, com reprodução dos estereótipos e falta de espaço para profissionais racializados.

Racismo cultural

É um tipo de racismo expressado pela ideia de que há uma cultura superior às outras, e isso abrange costumes, religiões, idiomas, tradições, entre outras coisas. Um exemplo dessa conduta pode ser observado no processo de colonização dos europeus sobre o continente americano.

Na visão dos colonizadores, os povos indígenas, habitantes nativos da América, eram selvagens e precisam ser convertidos à fé e à moral católica. Isso porque, seus hábitos e religiões eram muito diferentes dos praticados pelos habitantes do Velho Continente.

Já com as pessoas escravizadas vindas do continente africano neste período, a visão dos brancos europeus é que elas “não possuíam alma”, logo, tinham sua humanidade e cultura subjugadas e apagadas.

Até os dias de hoje a intolerância religiosa (principalmente com religiões de matriz africana), como parte do racismo cultural, é muito presente no Brasil. Com ataques e discurso de ódio contra religiões que não correspondem aos parâmetros cristãos,  como a umbanda e o candomblé.

Racismo ambiental ou racismo ecológico

Trata-se de um tipo de discriminação que, assim como o racismo estrutural, é encarada como uma característica natural da vida em sociedade. O racismo ambiental ou ecológico refere-se às condições nas quais pessoas que, por conta de um processo histórico que marginalizou suas etnias, são obrigadas a viver em condições ambientais de risco.

Exemplos podem ser observados em comunidades que se estabeleceram nas periferias das cidades ou em regiões mais remotas do país, com maioria de população não branca, onde há falta de saneamento básico e condições de infraestrutura como asfalto e iluminação pública.

Outra característica dessa discriminação está na forma em que as comunidades marginalizadas são atingidas por desastras ambientais naturais ou causados pela ação humana. Sem local adequado de moradia, por exemplo, as populações que vivem em morros ou encostas são, muitas vezes, vítimas fatais de chuvas e deslizamentos. Ou ainda, populações tradicionais que tem seu modo de vida afetado pelo desmatamento e o garimpo.

Assim como as outras, essa ramificação do racismo é ligada ao processo histórico de construção do País, no qual os povos tradicionais tiveram suas terras invadidas, enquanto os demais povos racializados foram apartados pelas consequências da escravidão, migração compulsória e da probeza a viver longe dos centros. E, de um modo geral, o processo de construção social também afastou as pessoas que sofrem com o racismo ambiental dos espaços de decisão do Estado.

Racismo científico ou racismo biológico

O racismo científico ou biológico começou a ser propagado a partir do século XVIII, com teorias científicas aceitas à época para justificar a superioridade racial de pessoas brancas sobre as demais etnias, em especial sobre as pessoas negras.

Com o discurso científico aflorado pelas ideais do Iluminismo (1685 – 1815), o racismo passou a ser aceito para justificar processos coloniais, de invasão de territórios e de exploração de pessoas, como o trabalho escravo. Ao tratar etnias não brancas como menos próximas da humanidade e incapazes de assimilar a moral branca europeia, a violência contra essas populações era atenuada para os racistas.

No Brasil, país com a maior população negra fora do continente africano, o racismo científico foi fundamental para a aplicação das chamadas políticas de embranquecimento da população, no pós abolição. Como as teorias colocavam brancos como superiores biologicamente, o incentivo à miscigenação e a criação de empecilhos para a imigração de outros povos são exemplos das tentativas de extinguir etnias não brancas por aqui.

Em setembro de 2022, a importante revista científica inglesa “Nature” publicou um editorial nomeado “Como a Nature contribuiu para o legado discriminatório da ciência”, no qual admite sua participação no racismo científico ao longo de 150 anos. Na publicação, o períodico afirma que “a ideia de que alguns grupos — pessoas não brancas ou pobres, por exemplo — eram inferiores, alimentou discriminação e racismo irreparáveis”.


Racismo recreativo

O termo “racismo recreativo” foi cunhado pelo pelo jurista, professor e pesquisador brasileiro Adilson José Moreira, em seu livro de mesmo nome, publicado em 2019. Adilson usou da nomenclatura para tratar de um tipo de discriminação que é pouco levada a sério por estar camuflada pelo “humor” ou por discursos de “liberdade de expressão”.

Ou seja, o racismo recreativo se expressa através de “piadas” que reforçam estereótipos de inferioridade relacionados a pessoas não brancas. E ainda, em espaços de lazer, como em um estádio de futebol, onde é “permitido” fazer ofensas racistas aos atletas sem que o autor seja considerado uma pessoa racista, já que aquele é um ambiente de “descontração”.

Quando presentes em apresentações de stand-up, por exemplo, as expressões do racismo recreativo são mascaradas de “humor ácido” ou “liberdade de expressão” e não como ataques à existência de outras pessoas. 


Racismo reverso 

Racismo reverso ou racismo contra pessoas brancas não existe. Isso porque, esse tipo de teoria, que considera que pessoas brancas podem sofrer ataques racistas das demais etnias, ignora todo processo histórico e cultural de construção da sociedade moderna, no qual os brancos estiveram no topo da pirâmide social, exercendo poder e dominação sobre os demais povos.

O racismo não é, apenas, um conjunto de insultos contra uma pessoa, mas um conjunto de fatores que historicamente colocaram o povo do qual o indivíduo marginalizado pertence em posições subalternas e sub-humanas, processos que não fazem parte da construção social de pessoas brancas.

Racismo no Brasil

De acordo com o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD Contínua 2022, dos 203,1 milhões de brasileiros, 42,8% se declararam como brancos, 45,3% como pardos e 10,6% como pretos, além dos 1,3% que se identificam com outras etnias.

A partir desses dados, entenda, de forma mais específica, o racismo no Brasil:

Dados sobre racismo no Brasil

  • Mercado de trabalho

Um estudo do IBGE, divulgado em novembro de 2022, revelou que trabalhadores brancos receberam R$ 3.099 por mês em média em 2021, contra R$ 1.764 dos pretos e R$ 1.814 dos pardos. Valores que apontam que brancos recebem, em média, uma renda 75,7% superior a de um preto e 70,8% maior que a de um pardo.

Entre os profissionais com Ensino Superior completo, o valor médio recebido por hora entre os brancos foi cerca de 50% superior ao dos pretos e cerca de 40% superior ao dos pardos. E ainda, mesmo representando 53,8% dos trabalhadores, os negros (pretos e pardos) ocupam apenas 29,5% dos cargos gerenciais.

Já na taxa de desemprego, brancos somaram 11,3%, em 2021, contra 16,5% entre pretos e 16,2% entre pardos. Nos trabalhos informais, pessoas brancas estão abaixo do índice nacional, somando 40,1% neste tipo de ocupação.

  • Encarceramento

Em 2022, as estatísticas de encarceramento de pessoas negras atingiu o maior patamar da série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), iniciado em 2005. Dos 826.740 presoss, 442.033 eram negros, número que representa 68,2% de pessoas encarceradas.

Em 2005, quando o FBSP começou a trabalhar a série histórica, os negros somavam 58,4% dos encarcerados, enquanto os brancos eram 39,8%. Já em 2022, o total de pessoas brancas presas é de 197.084, ou 30,4% da população carcerária. 

  • Violência

No Brasil, entre todas as etnias, as pessoas negras (pretas e pardas) são as maiores vítimas de violência. O 16° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado em junho de 2022, mostrou que 78% das vítimas de mortes violentas intencionais são negras, já nas mortes causadas pela polícia, o percentual sobe para 84%.

Na violência contra a mulher, negras são 62% das vítimas de feminicídio no Brasil, de acordo com o 16º Anuário. Enquanto dados da pesquisa “Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil”, do Datafolha e do Fórum Nacional de Segurança Pública, apontam que 45% das mulheres negras já sofreram alguma violência ou agressão.

Leis sobre racismo no Brasil

Desde 1989, o Brasil tem em vigor a Lei 7.716/89, conhecida como Lei do Racismo, que pune condutas de discriminação e preconceito relacionadas a cor, etnia, religião, origem e sexo. Porém, em janeiro de 2023, a Lei 14.532 foi sancionada, atribuindo algumas alterações a sua antecessora.

A nova legislação tipifica como crime de racismo também a injúria racial, com a pena aumentada de um a três anos para de dois a cinco anos de reclusão. Nesse contexto, o racismo é entendido como crime contra a coletividade, e a injúria, contra um indivíduo. 

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